Pamela Druckerman, americana radicada em Paris, comparou a
forma como os pais criam os filhos na França e nos Estados Unidos e concluiu:
os franceses preparam melhor para o futuro, mas não esperam grande coisa deste
futuro.
Casada com o colunista esportivo inglês Simon Kuper, mudaram
para Paris em 2004 e se tornou mãe e dona de casa. Olhando em volta, percebeu
que não estava se saindo bem em nenhuma das duas funções. Grávida, engordou
mais do que o recomendado e se encheu de preocupações, enquanto as vizinhas
gestantes francesas continuavam charmosas e em forma. Depois do parto, sofria
com as noites maldormidas, enquanto via as francesas retomar a rotina sem
olheiras. Levava a filha para almoçar fora e, entre crises de birra e
inapetência, invejava as crianças nas mesas em volta, comendo como gente
grande.
Pamela resolveu então investigar como os franceses
conseguiam criar filhos tão bem comportados. O resultado está no best-seller
Bringing up Bébé, lançado em vinte países e que acaba de chegar às livrarias
brasileiras com o título Crianças Francesas Não Fazem Manha, da editora Objetiva.
Mãe de mais uma menina e dois meninos que comem queijos e verduras como
parisienses natos, ocupada em escrever um segundo livro sobre o assunto,
Conheça alguns dos conselhos da autora para os pais, a partir da comparação
entre o que fazem as famílias americanas e francesas:
1. EQUILÍBRIO
“Nem tudo é perfeito
na França. Os franceses têm uma visão bem pessimista da vida, estimulada nas
escolas, na literatura, no cinema e nas artes. Para eles, os problemas são
imutáveis. Os americanos são mais positivos e esperançosos. Acreditamos que
podemos tudo. Em casa, tento compensar esta influência cultural francesa lendo
histórias americanas para os meus filhos. Além de boas maneiras à mesa, quero
que eles aprendam também a acreditar no final feliz.”
2. TEMPO LIVRE
“Meus três filhos estudam num escola pública de Paris, onde
também têm aulas de música e praticam esportes. Se morássemos nos Estados
Unidos, eles provavelmente teriam muito mais atividades. É difícil escapar da
pressão social, embora eu perceba que os americanos estão revendo este esquema
de agenda lotada dos filhos e dando mais importância ao convívio com a família.
Os pais franceses têm muito a ensinar nesta questão. A educação francesa
facilita o aprendizado de características que são essenciais para se tornar um
adulto saudável, como administrar o tempo livre sem ansiedade. As crianças
brincam sozinhas, sem monitores ou babás em volta o tempo todo. Os pais não
adaptam a decoração inteira da casa ao gosto dos filhos, mas respeitam seus
palpites no próprio quarto, que consideram seu território.”
3. O MOMENTO CERTO
“Os pais franceses estão tão preocupados com o futuro dos
filhos quanto os americanos, chineses e brasileiros. Como todos os pais do
mundo, reclamam da qualidade das escolas e querem que os filhos desenvolvam ao
máximo suas habilidades. A diferença é que os franceses respeitam mais cada
fase da infância. Acham que ensinar a criança a ler e escrever aos 3 anos,
quando ainda não tem maturidade para isso, não garante que ela terá sucesso no
futuro. Eles veem com desconfiança esta nova forma de educar, com alto estímulo
precoce.”
4. LIMITES
Dizer não e estabelecer limites transmite segurança à
criança. Ela entende com clareza como deve se comportar. É claro que, quando
ouve o não, vai reclamar e demonstrar raiva. Os pais franceses entendem que
sentir raiva e se frustrar faz parte da vida. Eles dialogam com os filhos, mas
não abrem espaço para longas discussões. São firmes e não se sentem culpados
porque sabem que é melhor para a criança aprender a ter paciência e
autocontrole. Se o filho interrompe um telefonema, por exemplo, a mãe francesa
pede que ele espere e retoma a conversa; a americana desliga e vai atendê-lo.
Assim, a criança americana cresce acostumada a ter o quer, na hora que quer, e faz
um escândalo se isso não acontece. Nos Estados Unidos, os pais têm medo de
contrariar os filhos porque são eles que mandam na rotina da família. O
resultado é que a criança acha que é o centro do universo e não se conforma
quando tem uma expectativa frustrada.”
5. MODELO
“Moro em Paris desde 2004 e ainda me sinto intimidada pelas
francesas. Não consegui ficar amiga de nenhuma parisiense. Elas são discretas e
distantes -- o oposto do que observei sobre as brasileiras quando morei em São
Paulo, em 2001. As brasileiras cuidam do corpo, mas não são escravas de um
padrão de beleza. Já as francesas seguem à risca um modelo restrito e pré‑definido
– sempre magra, bem vestida, sem exageros - e a mulher que não se enquadra nele
está perdida. Elas trabalham tanto quanto as americanas, mas conseguem ter mais
equilíbrio entre as horas dedicadas à carreira e aos relacionamentos pessoais,
até porque recebem mais ajuda do governo. Elas recebem auxílio financeiro para
criar os filhos e dispõem de creches e escolas públicas de boa qualidade.
Curioso: mesmo assim, vivem reclamando da vida.”
6. COM ALEGRIA
“As crianças francesas aprendem a ter prazer com as coisas
do dia-a-dia que, em outros países, são consideradas privilégio de adultos.
Comida, por exemplo. Os americanos se preocupam muito com a nutrição mais
correta e acham que o paladar das crianças pequenas é limitado ao doce e ao
salgado. Na França, elas são estimuladas desde cedo a experimentar diferentes
sabores. Para elas, as refeições são um ritual prazeroso: a mãe ou o pai vai ao
mercado com os filhos comprar os ingredientes para o jantar, eles cozinham
juntos, arrumam a mesa e se sentam para apreciar a comida, sem pressa e sem
televisão ligada. Desta forma aprendem a comer legumes e queijos naturalmente,
sem dramas. A hora de dormir também é encarada de modo diferente. Nos Estados
Unidos, se o bebê chora, vai para o colo imediatamente. Na França os pais
esperam um pouco, para ver se ele pega no sono sozinho novamente. Assim se
estabelece um modo de vida mais relaxado. Com joie de vivre, como eles dizem.”
Fonte: Veja - 18 fev 2013
Comentário:
Enquanto no Brasil, segundo a psicanalista Marcia Neder,
autora de "Déspotas Mirins ; Por que os filhos mandam nos pais? Ela diz que a 'pedocracia', ou seja, a
ditadura das crianças, está mais presente do que nunca.
■ O culto e a idolatria à criança está cada dia mais
presente nos lares brasileiros. E não é apenas uma postura de birras, pirraças
ou manha. Os 'reizinhos' não aceitam ouvir 'não', querem tudo do jeito deles e
na hora que eles querem. Mas em que momento essas crianças começaram a ser as
donas da casa?
■ Segundo ela, na cultura atual de idolatrar a criança, os
pais têm uma necessidade grande de serem amados pelos seus filhos. "E eles
dizem que 'se não dermos alguma coisa a eles, eles ficam chateados e dizem que
não amam a gente'. É uma inversão total de valores", reforça Neder.
■"É mais fácil deixar a criança ser rei. É mais fácil
do que aguentar o chilique. Dá trabalho educar. Para evitar isso é bem claro:
estabelecer quem é pai e quem é mãe, quem é adulto, e quem é a criança. Se você
não estabelece desde o início, tentar estabelecer depois fica complicado",
sugere.
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