domingo, 7 de dezembro de 2025

Julgamentos de Nurembergue: os nazistas no banco dos reús

 Com o fim da Segunda Guerra, os países aliados levaram os nazistas a julgamento. Pela primeira vez, representantes de um Estado tiveram que responder por seus crimes perante um tribunal internacional.

 Os nazistas Hermann Göring (1893-1946), Rudolf Hess (1894-1987), Joachim von Ribbentrop (1893-1946) e Wilhelm Keitel (1882-1946) no banco dos réus em Nurembergue. Da esquerda para a direita: os nazistas Hermann Göring (1893-1946), chefe da Luftwaffe; Rudolf Hess (1894-1987), vice de Hitler; o ministro do Exterior Joachim von Ribbentrop (1893-1946); e o comandante supremo das Forças Armadas Wilhelm Keitel (1882-1946)  Foto:  Keystone Archives/Heritage-Imags/picture-alliance

"Por meio deste, acuso as seguintes pessoas de crimes contra a paz, crimes de guerra e crimes contra a humanidade: Hermann Wilhelm Göring, Rudolf Hess , Joachim von Ribbentrop…"

A sala 600 do Palácio da Justiça de Nurembergue está lotada enquanto o procurador-chefe, o americano Robert H. Jackson, lê um nome após o outro. Sua lista é longa. O "Julgamento dos Principais Crimes de Guerra" contra 24 representantes de alto escalão do Estado nazista tem início em 20 de novembro de 1945, em Nurembergue. Ao longo dos próximos 218 dias de audiências, mais de 230 testemunhas serão interrogadas, 300.000 declarações serão lidas e 16.000 páginas de atas serão escritas.

A escolha de Nurembergue como local do julgamento não foi coincidência. A cidade bávara já havia sido palco das convenções em massa do Partido Nazista. Aqui, o regime nazista exerceu seu poder, e aqui as Leis de Nurembergue foram promulgadas — a legislação racista e antissemita que abriu caminho para o Holocausto .

MUDANÇA DE PARADIGMA

Foi a primeira vez na história que altos representantes de um Estado foram responsabilizados pessoalmente por seus atos desumanos. Uma novidade no sistema jurídico internacional.

Após a derrota da Alemanha na Segunda Guerra Mundial , as potências vitoriosas – Estados Unidos, Reino Unido, França e União Soviética – uniram-se: os crimes do Terceiro Reich não poderiam ficar impunes. Milhões de pessoas haviam sido vítimas do regime nazista – assassinadas em campos de concentração, vítimas da guerra, da fome, da escravização e do trabalho forçado.

Pela primeira vez, a questão da culpa individual também se tornou crucial. "Até então, um líder como Hermann Göring contava – e talvez até pensasse assim – que a Alemanha, o Estado pelo qual ele agia, seria responsabilizada, mas não ele próprio", explicou o jurista Philipp Graebke .

NINGUÉM SE DECLAROU CULPADO

À medida que os interrogatórios aconteciam, um réu após o outro declarava-se "inocente". "Os assassinatos em massa foram realizados exclusivamente e sem influência, sob as ordens do chefe de Estado, Adolf Hitler", argumentou Julius Streicher, um antissemita fanático e editor do jornal de propaganda nazista Der Stürmer.

 Walther Funk, em sua função de presidente do Reichsbank (o banco central da Alemanha nazista), negou aos judeus o acesso às contas bancárias.

Nessa posição, ele também ordenou a transferência para o Reichsbank dos bens de judeus assassinados nos campos de extermínio, incluindo o ouro de seus dentes. Em Nurembergue, ele testemunhou no tribunal: "Ninguém morreu como resultado de medidas que ordenei. Sempre respeitei a propriedade alheia. Sempre me esforcei para ajudar as pessoas necessitadas. E para lhes proporcionar, na medida do possível, felicidade e alegria."

 O braço direito de Hitler, Hermann Göring , parcialmente responsável pela construção dos primeiros campos de concentração, também se declarou "inocente" com convicção.

"Já disse que não tinha a menor ideia da dimensão do que estava acontecendo", respondeu quando questionado se havia uma política voltada para o extermínio dos judeus. Ele afirmou estar ciente apenas de que a emigração dos judeus estava sendo planejada, não o seu extermínio.

DOZE SENTENÇAS DE MORTE, SETE SENTENÇAS DE PRISÃO

Muitos dos principais nazistas não demonstraram remorso e consistentemente atribuíram a culpa exclusivamente a Hitler, que já não podia ser condenado, pois havia cometido suicídio nos últimos dias da guerra.

Mas toda negação foi inútil. As evidências eram esmagadoras: filmes dos campos de concentração, depoimentos de sobreviventes, cartas e ordens dos perpetradores. Pela primeira vez, o mundo viu as atrocidades cometidas nos campos de Auschwitz-Birkenau , Buchenwald e Bergen-Belsen.

Em 1º de outubro de 1946, os primeiros Julgamentos de Nurembergue foram concluídos. O tribunal proferiu doze sentenças de morte, sete sentenças de prisão e três absolvições aos réus nazistas do alto escalão.

"JUSTIÇA DOS VENCEDORES"

"Quando os réus foram condenados, a maioria dos alemães pensou: 'Agora finalmente pegamos os verdadeiros culpados e pronto'", diz Bernhard Gotto, do Instituto de História Contemporânea de Munique-Berlim.

Sua colega Stefanie Palm acrescenta: "Os Julgamentos de Nurembergue estabeleceram uma certa narrativa entre a população alemã: [...] todos os outros apenas cumpriram ordens, foram meros seguidores, não tinham culpa! [...] Adotou-se uma espécie de perspectiva de vítima: 'Somos as vítimas desse pequeno grupo em torno de Hitler'".

Sob esse ponto de vista, a maioria dos alemães se opôs aos doze julgamentos subsequentes contra advogados, médicos e industriais que atuaram no regime. O tribunal foi considerado "justiça dos vencedores" [expressão pejorativa usada para se referir à aplicação da justiça pela parte vitoriosa de um conflito], porque levanta imediatamente a questão de até onde se estende a responsabilidade pelos crimes nazistas", diz Gotto.

"E então, de repente, não são mais apenas Göring e Keitel, a Wehrmacht [as Forças Armadas Alemãs), Himmler e, claro, Hitler que são acusados ​​de seduzir os alemães, mas o fardo dessa culpa é distribuído por mais pessoas, e a maioria dos alemães não queria aceitar isso."

PRECURSORES DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL

Hoje, os Julgamentos de Nurembergue são considerados um marco no direito internacional. Em 1945, esperava-se que os padrões legais aplicados em Nurembergue fossem replicados igualmente a todos a partir de então. Nenhum criminoso de guerra deveria ter a possibilidade de invocar unilateralmente o poder de seu cargo ou as leis de seu próprio país.

O jurista Philipp Graebke afirma que, a partir dos Julgamentos de Nurembergue, "podemos traçar uma linha direta, através da tradição dos tribunais da ONU para crimes de guerra na década de 1990, até a criação do Tribunal Penal Internacional (TPI)".

No entanto, "isso certamente não levou à aplicação impecável do direito penal internacional desde 1946, nem à aplicação impecável que vemos hoje", esclarece ele.

O TPI foi estabelecido em Haia, na Holanda, apenas em 1998 e iniciou suas atividades em 2002. Mas nem todos os Estados o reconhecem. As principais grandes potências estão ausentes dos 125 Estados-membros: Estados Unidos, Rússia, China e Índia. Israel também não é membro.

TPI: APENAS UM TIGRE DE PAPEL?

Mas mesmo Estados que reconhecem o TPI já desafiaram mandados de prisão. Até recentemente, a regra para líderes acusados ​​era simples: se você não quer ir para a prisão, basta não sair do seu país.

Agora, nem isso é mais necessário. Por exemplo, o presidente da Rússia, Vladimir Putin , contra quem existe um mandado de prisão pelo sequestro de crianças ucranianas, viajou para a Mongólia, signatária do TPI, em setembro de 2024 e foi recebido com todas as honras. A Mongólia é altamente dependente economicamente de seu poderoso vizinho.

Portanto, o fato de um criminoso de guerra ser levado a julgamento depende do empenho dos Estados-membros. E o próprio Tribunal de Haia não têm os recursos nem a autoridade para levar os suspeitos a julgamento.  Fonte: DW - quarta-feira, 19 de novembro de 2025

domingo, 30 de novembro de 2025

Fome à americana: 47 milhões nos EUA vivem sem saber se terão o que comer

Nos Estados Unidos, 47,4 milhões de pessoas vivem na incerteza diária sobre a próxima refeição, segundo dados oficiais de 2023 e 2024.

Enquanto o Brasil tem 54,7 milhões de pessoas sem saber se terão o que comer, os EUA —com economia 13 vezes maior— exibem um contingente semelhante de vulneráveis.

De tamanho comparável ao Bolsa Família, o Snap teve repasses afetados durante os 43 dias do "shutdown", entre 1º de outubro e 12 de novembro, quando o governo dos EUA parou por falta de acordo orçamentário no Congresso.

"Há uma polarização no mercado de trabalho: há vagas que tornam alguém riquíssimo e muitos empregos que pagam muito pouco diante custo de vida nos EUA", diz Luke Shaefer, professor de políticas públicas da Universidade de Michigan e um dos principais especialistas do país em pobreza e bem-estar social.

Segundo ele, até o ano passado o Snap era um raro exemplo de programa social bem-sucedido em um país conhecido pela precariedade de sua rede de proteção.

O salário mínimo federal está congelado em US$ 7,25 a hora desde 2009. Nesse período, os custos básicos dispararam. Entre 2011 e 2024, o preço médio das casas saltou mais de 86% —de US$ 225 mil para US$ 419 mil…

 A retomada dos repasses do Snap no último dia 12 não significa que o problema acabou para quem depende do benefício.

ESPECIALISTAS DIZEM QUE A TENDÊNCIA NOS EUA É QUE MAIS PESSOAS DEPENDAM DO SNAP.

Hoje são cerca de 42 milhões de beneficiários (1 a cada 8 americanos), a um custo de US$ 100 bilhões (cerca de R$ 533 bilhões). Em média, o repasse foi de US$ 190 por mês (cerca de R$ 1.000).

No Brasil, o Bolsa Família atendeu em novembro 48,6 milhões de pessoas (cerca de 1 a cada 4 brasileiros) —o menor patamar de participantes em três anos.

O benefício médio ficou em R$ 683. O orçamento reservado para este ano é de R$ 158,6 bilhões.

Embora ambos visem reduzir fome e pobreza, Snap e Bolsa Família têm critérios diferentes. Nos EUA, o benefício só pode ser usado para comprar alimentos.

No Brasil, o objetivo é a transferência de renda, e a família decide como gastar —em comida, remédios ou material escolar, por exemplo.

O Bolsa Família cobra contrapartidas de frequência escolar e acompanhamento de saúde, inexistentes no programa americano.

Por outro lado, o Snap exige que adultos beneficiários comprovem um certo período de horas mensais trabalhadas, ainda que de modo voluntário.

Trump não esconde o interesse em cortar o Snap, ação que já começou com a aprovação em julho da lei orçamentária "One Big Beautiful Bill Act" (em tradução livre, "Uma Grande e Bela Lei"), que impôs regras mais rígidas ao programa.

Os critérios para receber o benefício variam de estado para estado, mas, basicamente, é preciso comprovar renda abaixo de determinado limite.

O que muda no Snap com Trump

·        Trabalho obrigatório: adultos de 18 a 64 anos sem emprego ou atividade qualificada por 80h/mês só recebem benefício a cada período de três anos.

·        Benefícios menores: famílias sem idosos ou deficientes terão menos ajuda. Isenção para cuidadores vale só para crianças menores de 14 anos.

·        Imigrantes afetados: refugiados, asilados e pessoas com proteção humanitária têm elegibilidade limitada ou eliminada.

·        Especialistas consideram a exigência de 20 horas de trabalho por semana inexequível em algumas regiões e estimam que milhões perderão o benefício.

 Fonte: UOL, em Washington (EUA)-29/11/2025 

 

quinta-feira, 27 de novembro de 2025

Bomba da 2ª Guerra força evacuação de 21 mil na Alemanha

 Uma bomba da Segunda Guerra Mundial encontrada na cidade de Nurembergue, no sul da Alemanha, provocou a evacuação de 21 mil pessoas  no sábado (15/11). O artefato acabou sendo desativado com sucesso durante a madrugada.

Três especialistas em remoção de explosivos atuaram por cerca de uma hora para desabilitar os explosivos da bomba, que pesava cerca de 450 quilos.

Após a operação de desativação, a bomba foi removida e os moradores puderam retornar às suas casas.

Antes da remoção, vias e estradas de ferro dentro de um raio de 800 metros foram bloqueados e cerca de 21 mil pessoas tiveram que deixar suas casas e apartamentos.

Essa foi a maior operação de evacuação já realizada em Nurembergue após a descoberta de uma bomba da época da 2° Guerra, informaram as autoridades da cidade.

A bomba havia sido encontrada nesta semana durante trabalhos de construção na Rua Avenarius, no distrito de Grossreuth, no oeste da cidade.

CENTENAS DE EQUIPES DE EMERGÊNCIA NO LOCAL

A partir das 19h30 (horário local) de sexta-feira, a polícia começou a bloquear ruas na área afetada. Veículos com alto-falantes percorreram a região para informar os moradores.

Ônibus de transporte levaram os afetados ao centro escolar de Berliner Platz (Praça de Berlim), onde um centro de atendimento foi montado.

As autoridades também pediram aos moradores que deixassem suas casas o mais cedo possível e ficassem com parentes ou amigos.

Quase 500 bombeiros, cerca de 250 voluntários do serviço de resgate, 60 membros da organização de proteção civil (THW) e mais de 100 policiais participaram da operação em apoio às equipes que desativaram os explosivos.

PROBLEMA RECORRENTE NA ALEMANHA

As descobertas de bombas da Segunda Guerra Mundial em canteiros de obras e construções ocorrem com frequência em todo o país.

Em setembro, duas bombas da Segunda Guerra Mundial encontradas em bairros diferentes de Berlim, acabaram forçando a retirada de mais de 20 mil moradores de suas casas.

Em agosto, equipes de segurança desativaram uma bomba de fabricação britânica encontrada em Dresden, no leste da Alemanha. A operação para desarmar o dispositivo de 250 quilos exigiu a evacuação de 17 mil pessoas que viviam em um raio de mil metros de onde o artefato se encontrava.

Uma bomba da 2ª Guerra de 500 quilos encontrada em Berlim em 2023Uma bomba da 2ª Guerra de 500 quilos encontrada em Berlim em 2023

Em junho, a cidade de Colônia precisou evacuar 20 mil pessoas para desarmar três bombas americanas lançadas por aviões na Segunda Guerra. No estado da Renânia do Norte-Vestfália, onde fica a cidade, mais de 1,6 mil explosivos foram desativados no ano passado.

Já no estado de Brandemburgo, que fica ao redor de Berlim, apenas em 2024, especialistas coletaram 90 minas, 48 mil granadas, 500 bombas incendiárias, 450 bombas de alto poder explosivo com mais de cinco quilos e cerca de 330 mil cartuchos.

Cidades como Frankfurt também enfrentam o problema. Em 2018, 60 mil pessoas precisaram deixar suas casas para que um explosivo fosse desarmado.

Em 2012, uma bomba precisou ser completamente detonada em Munique. Procedimento similar acontece com frequência quando dispositivos são encontrados no leito de rios como o Elba e o Reno.

O problema também atinge vários países vizinhos. Na França e na Bélgica, munições das duas Guerras Mundiais são encontradas regularmente, especialmente da Primeira Guerra, em regiões como Verdun e Somme.

Na Itália, a seca no Vale do Rio Pó em 2022 trouxe à tona explosivos antigos. No Reino Unido, uma bomba alemã de uma tonelada teve que ser detonada de forma controlada em Exeter em 2021, danificando mais de 250 prédiosFonte: DW - sábado, 15 de novembro de 2025