Em fevereiro, ainda antes do
Carnaval, Berlim considerou pela primeira vez possibilidade de quarentena no
país. Até então, risco oficial era baixo. Somente em meados de março, medidas
de isolamento foram implementadas.
O primeiro relato do novo
coronavírus foi feito ao mundo no final do ano passado e pouco menos de um mês
depois a covid-19 chegou à Alemanha. Apesar de sinais, autoridades alemãs
teriam subestimado a doença por semanas e, assim, demorado para implementar de
um plano da ação com medidas para conter o avanço da pandemia, segundo mostra
uma reportagem feita pelo jornal Welt am Sonntag e pela emissora pública
Bayerischer Rundfunk (BR).
De acordo com a reportagem, em 31 de dezembro, o
ProMED, uma rede eletrônica global para monitorar novas doenças infecciosas,
lançado em 1994, enviou um e-mail sinalizando o surto de uma forma desconhecida
de pneumonia na China. O Instituto Robert Koch (RKI), responsável pelo controle
de doenças na Alemanha, foi um dos destinatários desse e-mail. Essas
informações deveriam ter desencadeado a implementação de medidas preventivas.
Em 2012, o governo alemão
publicou um relatório de análise de risco destinado a proteger a população. O
documento foi elaborado em resposta a um surto de Sars e detalha medidas
específicas a serem tomadas para conter uma epidemia viral, sugerindo o
fechamento de escolas e o cancelamento de grandes eventos.
Porém, várias semanas se
passaram, desde a chegada do primeiro relato da nova doença, até que isso
acontecesse.
"O que podemos ver aqui é mais brando que um
surto de gripe", chegou a dizer o ministro alemão da Saúde, Jens Spahn,
sobre a nova doença, em 23 de janeiro a uma emissora pública de televisão.
No final de janeiro, o estado
da Baviera, no sul da Alemanha, registrou os primeiros casos de covid-19, a
maioria com sintomas leves. Ao olhar para o passado, médicos e funcionários
dizem que essa situação foi enganosa e fez com que eles assumissem rapidamente
que a doença poderia ser tratada de forma fácil.
"Se a situação tivesse
começado com casos graves, o perigo poderia ter sido avaliado de forma
diferente", disse o médico Clemens Wendtner, do hospital do bairro de
Schwabing, em Munique, onde os primeiros pacientes foram tratados.
Em 29 de janeiro, a comissão
parlamentar de Saúde no Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão) debateu
pela primeira vez o coronavírus. Foi o último ponto da agenda daquele dia. Na
época, o presidente do RKI, Lothar Wieler, aproveitou a oportunidade para
criticar a política de informações da China e apontou que ainda não estava
claro como o vírus poderia ser transmitido. Uma transcrição da reunião mostra
que o relatório de análise de risco sequer foi mencionado nas discussões.
Duas semanas depois, em 12 de fevereiro, o ministro
alemão da Saúde disse ao Parlamento que não havia perigo real de uma pandemia.
Spahn afirmou na ocasião que a situação do coronavírus na Alemanha estava
"sob controle", o que mostra que "nos preparamos bem e estamos
tomando grandes precauções."
O deputado federal do partido
A Esquerda Achim Kessler se queixou que até então a ameaça estava sendo
minimizada. "Fomos informados de que a Alemanha tinha planos de contenção
para uma pandemia de gripe e que esses estavam sendo adaptados ao vírus atual e
que tudo isso transcorria sem nenhum problema", disse.
Segundo a pesquisa mais
recente, o governo em Berlim considerou pela primeira vez uma quarentena total
no final de fevereiro. Funcionários do Ministério do Interior da Alemanha discutiram
se as medidas de isolamento social poderiam representar um problema de
segurança interna. Nenhuma ação foi
tomada e a Alemanha festejou o Carnaval.
Enquanto isso, a avaliação
oficial de risco para a Alemanha permaneceu "baixa", segundo RKI.
"O coronavírus chegará à Alemanha", disse Wieler, em 24 de fevereiro.
"Mas não explodirá. Em vez disso, será lento e afetará certas
regiões."
Em 26 de fevereiro,
especialistas do Ministério do Interior se reuniram em Berlim, segundo atas
confidenciais da reunião obtidas pela reportagem. Nesse encontro, foi
mencionada a grave escassez de máscaras faciais. Os participantes também
discutiram a proibição da exportação de equipamentos de proteção.
Em 2 de março, a comissão
parlamentar de Saúde se reuniu novamente. Os membros discutiram o cancelamento
de grandes eventos públicos. O ministro da Saúde, no entanto, apontou que
caberia a cada estado decidir sobre a questão e que o governo em Berlim não
deveria dar a impressão de estar lhes dizendo como fazer seu trabalho.
Foi preciso mais uma semana para os primeiros eventos
serem cancelados. Em 11 de março, a OMS declarou uma pandemia mundial.
Uma semana depois, em 18 de março, a chanceler federal
alemã, Angela Merkel, fez um raro pronunciamento na TV, pedindo que a ameaça
fosse levada a sério. Ela classificou a pandemia como o "maior desafio
desde a Segunda Guerra Mundial" para a sociedade alemã.
Foram precisos 78 dias, desde os primeiros relatos do
surto, para que o governo alemão apresentasse uma resposta para conter o avanço
da covid-19, apesar de vários alertas neste período. Fonte: Deutsche Welle-18.05.2020
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