A
decadência da civilização é coisa divertida. Ainda me lembro do tempo em que a
minha avó ensinava algumas regras de etiqueta. Coisas simples, como não comer
com as mãos ou não olhar pasmado para as pessoas. "Menino, maneiras!"
E o menino, com a dificuldade própria dos selvagens, tentou refinar-se.
Podemos
dizer que usa talheres. E não tem por hábito imitar o personagem central de
"Laranja Mecânica", com os olhos esbugalhados, a olhar em volta como
um demente.
Pois
bem: que diria a minha avó - que hoje faria 93 anos - sobre a mais recente
recomendação da Universidade de Oxford aos seus estudantes?
Leio
na imprensa britânica que a Unidade para a Igualdade e a Diversidade está
preocupada com "microagressões racistas". Essa frase é todo um
manicómio. "Unidade para a Igualdade e a Diversidade".
"Microagressões racistas". Matem-me. Já. E depois enterrem-me: Oxford
afirma que desviar o olhar quando se fala com "alguém" (leia-se:
negro, asiático, talvez esquimó) pode ter consequências nefastas na saúde
mental do outro.
Não
pode, gente: se o outro se sente ofendido porque alguém desviou o olhar é
porque já não tem grande saúde mental para preservar.
Além
disso, Oxford também recomenda que ninguém seja inquirido sobre a sua origem.
"De onde vem?" deixou de ser uma curiosidade normal entre gente
normal - e internacional. É um ofensa que esconde, sei lá, um prazer perverso,
colonialista, obviamente genocida. Presumo que, para a Unidade, o ideal é
ninguém falar com ninguém - mas sempre de olhos abertos, como peixes no
aquário.
Comecemos
pelo óbvio: na sua ânsia paranóica de combater o "racismo", a Unidade
comete uma "macroagressão racista". Porque parte sempre do
pressuposto de que um branco que desvia o olhar perante um negro é um nazista
em potência. Não existem outras razões: distracção, cansaço, timidez, educação.
Ou a velha e boa indiferença que é a base de uma sociedade tolerável.
A
Unidade, como qualquer organismo totalitário, inverte a presunção de inocência.
E, como qualquer organismo totalitário, condena com base em suposições. Pior:
condena o que acredita existir na cabeça dos outros. O racismo já não é um
crime objectivo, ou seja, identificável em palavras ou actos. Pode ser um
delito de consciência. Socorro?
Felizmente,
a Universidade de Oxford resolveu pedir desculpas pelo excesso de zelo. Mas
não, obviamente, porque as recomendações da sua Unidade para a Igualdade e a
Diversidade são uma aberração moral que só envergonha a instituição.
O
problema, pelos vistos, é que os conselhos podem ser discriminatórios para
autistas ou pessoas com transtornos ansiosos, que têm certa dificuldade em
manter o contacto visual.
O mundo caminha para o apocalipse quando só o pensamento politicamente correcto é capaz de frear o pensamento politicamente correcto. Teremos salvação? Por favor, não olhem para mim. Fonte: Folha de São Paulo - 05/05/2017 – João Pereira Coutinho, escritor português
O mundo caminha para o apocalipse quando só o pensamento politicamente correcto é capaz de frear o pensamento politicamente correcto. Teremos salvação? Por favor, não olhem para mim. Fonte: Folha de São Paulo - 05/05/2017 – João Pereira Coutinho, escritor português
Comentário
Estado-Babá
- são presunçosos, e acreditam que sabem melhor que os outros como a vida deve
ser vivida. Eles partem da premissa arrogante de que conhecem as escolhas
“certas”. São moralistas autoritários, que desejam impor seu estilo de vida aos
demais. Viver é assumir riscos, mas os covardes babás querem uma vida
totalmente segura (e sem graça), e pior, querem obrigar os outros a desejar o
mesmo. Rodrigo Constantino
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