terça-feira, 15 de novembro de 2016

Atestado de consentimento sexual

E por falar em documentos para assinar: não seria boa ideia se homens e mulheres, momentos antes de qualquer intimidade, assinassem uma declaração onde atestassem o seu consentimento?

É uma sugestão. Tudo porque as autoridades inglesas, alarmadas com os abusos sexuais que existem por aqui, tencionam exigir ao cavalheiro uma prova cristalina de que a donzela, de facto, estava na posse das suas faculdades racionais e deu, com todas as letras, o seu abençoado "sim".

Entendo a preocupação. E, quando o cenário são abusos, mão pesada com os abusadores. Mas pergunto se uma exigência dessas, para além de juridicamente discutível (inversão do ônus da prova etc. etc.), não poderá desproteger muitos homens decentes de qualquer ameaça malévola, vingativa ou infundada.

Um documento assinado pelas partes talvez fosse mais seguro. Ou, então, a presença constante de uma testemunha que acompanharia todo o processo - dos mais inocentes preliminares ao descanso tabágico dos guerreiros.

Com a Europa flagelada pelo desemprego, testemunhas atentas e silenciosas talvez fossem o início de novas e promissoras carreira. Fonte: Folha de São Paulo - 09/02/2015- João Pereira Coutinho, escritor português

Comentário: Recentemente  o governador do Estado de Nova York aprovou uma lei em que exige que haja um consentimento claro para que as relações sexuais aconteçam e define o termo como "um acordo positivo, consciente e voluntário de se envolver em uma atividade sexual" — o consentimento, no entanto, pode ser não-verbal, desde que o comportamento do parceiro(a) não deixe dúvidas sobre o seu desejo.
Para geração milênio, outro celeuma, um aplicativo para smartphones cuja proposta é diminuir o número de casos de estupro e de falsas acusações de violência sexual está causando polêmica entre ativistas feministas. Batizado de We-Consent (Nós consentimos, em tradução livre), o app permite que seus usuários registrem em vídeos de 20 segundos um consentimento mútuo para o início de uma relação sexual — o arquivo criptografado é então armazenado para uso policial caso seja necessário.
Para geração conservadora, talvez uma minuta de contrato de consentimento ou contrato de gaveta (para amantes) ou carnezinho de consentimento, ou um contrato de prestação de serviço, cada um fica com uma cópia.

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Retratos de família

Fotografias: haverá coisa mais preciosa? Em tempos arcaicos, talvez. A minha avó costumava contar que o maior tesouro que trouxe da casa dos pais eram as fotos de família. Álbuns e álbuns com fotos em preto e branco, algumas coloridas (manualmente, claro) e impressas em cartão grosso. Todas elas insubstituíveis. Estranho tempo, esse, em que os retratos valiam tanto como ouro. Ou até mais que ouro.

Hoje vivemos o supremo paradoxo: nunca se tiraram tantas fotos; nunca elas tiveram tão pouco valor.

O jornal "Guardian" avisa que 2014 será o ano em que o mundo vai bater recordes no número de fotos tiradas: qualquer coisa como 3 trilhões. Esse excesso não pode ser coisa boa: a facilidade com que hoje se tiram fotos é diretamente proporcional à facilidade com que nos esquecemos delas.

Uma amiga, aliás, contava-me há tempos uma história instrutiva: em três anos de maternidade, ela acumulara mais de mil fotos do primogênito. Até descobrir que não tinha nenhuma para mostrar em papel ou em moldura -permaneciam todas na memória do laptop, ou na câmera, ou no celular. À espera de melhores dias.

Três trilhões de fotos para 2014, diz o "Guardian". E, no fim de contas, é como se o mundo não tirasse uma única foto que realmente importe. Fonte: Folha de São Paulo - 07/01/2014-João Pereira Coutinho, escritor português

Comentário: Vivemos num mundo digital saturado. Tudo é descartável. A novidade de ontem virou rotina no presente e amanhã estará morta. 

sábado, 12 de novembro de 2016

Diário da Europa - GPS

Anos atrás, lembro-me de assistir a um documentário inglês que nunca mais esqueci. Sobre a formação dos taxistas em Londres. Coisa exigente?

Digamos apenas isso: desconfio que um doutorado em Harvard seria ligeiramente mais fácil. Para dirigirem em Londres, os candidatos entregam-se a uma preparação minuciosa, fatigante, demencial, memorizando cada avenida, rua, beco com precisão fotográfica.

Depois, quando se sentem preparados para o exame oral, apresentam-se perante o Grande Inquisidor - uma figura sinistra em seu requintado sadismo - que colocava ao candidato tremelicante perguntas do gênero: "Eu estou na rua X e pretendo ir para a rua Y. Qual o trajeto mais próximo?"

O candidato descrevia o trajeto de memória - isso, claro, se não desmaiasse ou tivesse um infarto entretanto. Não sei como estão as coisas hoje em dia. Em Londres, não tenho tido motivos de queixa.

Em Lisboa, pelo contrário, cresce o número de motoristas que desconhece endereços básicos. De tal forma que eu próprio já me ofereci várias vezes para dirigir o táxi. A culpa, segundo parece, é do GPS: se o endereço não existe no GPS, nada feito. Usar a cabeça (e a memória) é primitivismo do século passado.

Aliás, a cultura do GPS é tão avassaladora que, segundo as notícias, as próprias gôndolas de Veneza passarão a ter um aparelho para ajudar os gondoleiros. 
Imagino a cena: o casal, abraçado e apaixonado, passando sob a Ponte dos Suspiros. E, no momento em que se preparam para um beijo, a maquineta dispara com a sua voz mecânica: "Daqui a trinta metros, vire à direita." Se o amor sobrevive a isto, sobrevive a tudo. Fonte: Folha de São Paulo - 21/10/2013 - João Pereira Coutinho, escritor português. 

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

Abuso-Facebook

Antigamente, a espionagem dava trabalho. Muito trabalho. E algum risco à mistura.
Se você queria saber o que se passava na casa do vizinho, era preciso invadir a casa; montar grampos e câmeras ocultas; voltar a sair da casa; e depois passar a noite inteira de olhos abertos e ouvidos idem.
Com sorte, era possível saber qualquer coisa. Com uma semana de vigia, era possível saber alguma coisa.

Com um mês ou um ano, era possível ter uma ideia razoável sobre a vida do sujeito.

Francis Ford Coppola filmou isso em "The Conversation" (1974). Filme primoroso com um Gene Hackman primoroso - mas, mil perdões, terrivelmente "démodé".

Hoje, esses contorcionismos são absurdos. Não vale a pena invadir a casa do vizinho.

Basta ir ao Facebook para saber o que ele é, o que faz, do que gosta, com que está, onde está, por onde andou, em que terra nasceu, onde estudou, o que estudou, que lugares frequenta, quem são os seus amigos, que matérias ele lê, que músicas ouve - a lista de informações é infinita e, pormenor fundamental, não custa um tostão a nenhuma agência de espionagem.

Sim, o escândalo revelado por Edward Snowden mostra o intolerável abuso da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos sobre cidadãos nacionais e estrangeiros.

Mas convém lembrar que o abuso só foi possível porque havia combustível para ele: o nosso público narcisismo. Ou, para usar a feliz expressão de Sérgio Dávila nesta Folha, porque nos transformamos em "facebobos".

Não precisamos de ser torturados. Não precisamos de ser interrogados. Nós confessamos tudo alegremente. E voluntariamente. Fonte: Folha de São Paulo-15/07/2013 - João Pereira Coutinho, escritor português,doutor em ciência política.
Comentário: Facebook é a agência de inteligência global a serviço da sociedade. Éa CIA da sociedade de consumo

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

terça-feira, 8 de novembro de 2016

Vida moderna

Aeroporto. Estou sentado junto à porta de embarque, ainda encerrada. O voo será daqui a 45 minutos. Mas, à minha frente, os passageiros já estão em pé e começam a formar fila quilométrica para entrar. Mistério.

Eu entenderia esta extravagância se, por hipótese, voos lotados deixassem metade dos passageiros em terra. Ou essa metade tivesse que ir no porão.

Se assim fosse, eu próprio passaria a noite no aeroporto para evitar o suplício. Ou subornaria alguém só para conseguir um lugar, como acontece nos ônibus do Quênia   ou nas viagens de trem pela Índia.

Mas como explicar esta paixão dos seres humanos por filas idiotas quando os lugares já estão reservados? Será que eles pensam que existe sempre a possibilidade do avião fugir antes da hora?
Conclusão: deixo todo mundo entrar e depois, vagarosamente, levanto-me e entro eu.
Claro que, sendo o último a entrar, existem sérias hipóteses de não ter espaço para arrumar a bagagem. Mas as aeromoças são sempre prestáveis, esmagando as malas dos outros com a minha mala retardatária. Agora, sim, prontos para a decolagem, comandante. Fonte: Folha de São Paulo - 07/10/2013 - João Pereira Coutinho,escritor português.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

A tradição do Halloween

No fim de outubro, vê-se por toda parte caretas esculpidas em abóboras e lojas cheias de artigos de horripilar e causar sustos. A tradição vem na realidade da Europa.

ORIGEM
De onde vem a palavra "Halloween"? Em 1º de novembro, os católicos celebram o Dia de Todos os Santos. Em inglês, "All Hallows". Por isso, a noite de 31 de outubro é "All Hallows Evening", que, abreviado, resulta em Halloween.

FESTA MILENAR DOS CELTAS
A noite de 31 de outubro marcava o fim do verão e o final do ano. O verão era considerado o tempo da vida e, o inverno, o da morte. E estes dois mundos se encontravam em 31 de outubro. Nesta noite, eram oferecidas aos antepassados comidas saborosas. Com o tempo, as pessoas começaram a se fantasiar de morto para enganar a morte e, assim, não serem levadas por ela.

CRIANÇAS FANTASIADAS
No século 19, muitos irlandeses, que são descendentes dos celtas, emigraram para os Estados Unidos e levaram suas tradições. A cada ano, são esculpidas abóboras e celebradas festas de Halloween entre adultos e crianças. Elas se fantasiam e vão pela vizinhança em busca de doces.

TRAVESSURAS PARA QUEM NÃO DÁ DOCE
Muitos já guardam doces em casa neste dia, esperando a visita de crianças. E, como punição, quem não está preparado pode ser assustado por elas. Em alguns locais acontecem brincadeiras como jogar ovos crus nas paredes das casas. Fonte: Deutsche Welle - Data 30.10.2016