A pergunta que inflamou a reação do magistrado era se, assim
como ocorre no Brasil, os juízes da instância máxima do Poder Judiciário sueco
têm direito a carro oficial com motorista e benefícios extra-salariais como
auxílio-saúde, auxílio-moradia, gratificação natalina, verbas de representação,
auxílio-funeral, auxílio pré-escolar para cada filho, abonos de permanência e
auxílio-alimentação. "Não consigo entender por que um ser humano gostaria
de ter tais privilégios. Só vivemos uma vez e, portanto, penso que a vida deve
ser vivida com bons padrões éticos. Não posso compreender um ser humano que
tenta obter privilégios com o dinheiro público", acrescentou Lambertz. "Luxo
pago com o dinheiro do contribuinte é imoral e antiético", completou o
juiz sueco.
Na Suécia, o salário dos magistrados da Suprema Corte - que
não têm status de ministro - é de 109,5 mil coroas suecas, o que equivale a aproximadamente
R$ 46 mil. Uma vez descontados os altos impostos vigentes no país, os
vencimentos de cada juiz totalizam um valor líquido de 59 mil coroas suecas,
segundo dados do Poder Judiciário sueco - o equivalente a cerca de R$ 25 mil.
"Isso é o que se ganha, e é um bom salário. Pode-se
viver bem com vencimentos desse porte, e é suficiente", diz Lambertz.
Ex-professor de Direito da Universidade de Uppsala e ex-Provedor de Justiça
(Ombudsman) do Governo, Göran Lambertz chefiou ainda uma das divisões do
Ministério da Justiça antes de se tornar juiz da Suprema Corte, cargo vitalício
que ocupou até recentemente.
Benefícios extra-salariais, oferecidos a juízes de todas as
instâncias no Brasil, não existem para juízes suecos de nenhuma instância.
"Privilégios como esses simplesmente não são
necessários. E custariam muito caro para os contribuintes", o jurista
sueco Hans Corell, ex-Secretário-Geral Adjunto da ONU para Assuntos Jurídicos. "Não
quero emitir julgamentos sobre sistemas de outros países, pois eles têm seus
próprios motivos e tradições. Mas não
temos esse tipo de tradição na Suécia", observa Corell.
Nas demais instâncias do Judiciário, o salário médio bruto
de um juiz na Suécia é de 66 mil coroas suecas, o que equivale a aproximadamente
R$ 28 mil. Em valores líquidos, o salário médio dos juízes é de cerca de 41 mil
coroas suecas - aproximadamente R$ 17,4 mil. O salário médio no país é de 32,2
mil coroas suecas (cerca de R$ 13 mil), de acordo com as estatísticas da
confederação sindical sueca LO (Landsorganisationen).
NEGOCIAÇÕES SINDICAIS NA SUÉCIA
Para reivindicar reajustes salariais, os juízes suecos
seguem o mesmo procedimento aplicado aos trabalhadores de qualquer outra
categoria: as negociações sindicais.
A negociação dos reajustes salariais da magistratura se dá
entre o sindicato dos juízes suecos (Jusek) e o Domstolsverket, a autoridade
estatal responsável pela organização e o funcionamento do sistema de justiça.
A negociação depende essencialmente do orçamento do
Domstolsverket, que é determinado pelo Ministério das Finanças.
"Os juízes têm influência limitada no processo de
negociação salarial", diz Carsten. "As autoridades estatais do
Domstolsverket recebem a verba repassada pelo governo, através do recolhimento
dos impostos dos contribuintes, e isso representa o orçamento total que o
governo quer gastar com as Cortes. A partir desse orçamento, o Domstolsverket
se faz a pergunta: quanto podemos gastar com o reajuste salarial dos
juízes?", explica.
JUÍZES SEM SECRETÁRIAS NEM CARROS OFICIAIS
Nos pequenos escritórios dos juízes, não há secretária na
porta, nem assistentes particulares.
No sistema sueco, os magistrados contam com uma equipe de
assistentes que trabalha, em conjunto, para todos os 16 magistrados da corte.
São mais de 30 profissionais da área de Direito, que auxiliam os juízes em
todos os aspectos de um caso jurídico.
O tribunal conta ainda com uma equipe de cerca de quinze
assistentes administrativos, que auxiliam a todos os juízes. Ou seja: nenhum
juiz tem secretária ou assistente particular para prestar assistência exclusiva
a ele, e sim profissionais que lidam com aspectos específicos dos casos
julgados pela corte.
E nenhum juiz - nem mesmo o presidente da Suprema Corte -
tem direito a carro oficial com motorista.
FÉRIAS: MÁXIMO DE 35 DIAS
O período máximo de férias a que os juízes suecos têm
direito é de 35 dias por ano. A variação depende da idade do magistrado: juízes
de até 29 anos têm 28 dias de férias, e a partir de 30 anos de idade o período
é de 31 dias anuais. Juízes acima de 40 anos passam a ter direito a 35 dias de
férias.
No Brasil, a lei determina que os juízes, diferentemente dos
demais trabalhadores, têm 60 dias de férias por ano.
Qualquer cidadão pode checar as contas dos tribunais e os
ganhos dos juízes. Autos judiciais e processos em andamento também são abertos
ao público.
FISCALIZAÇÃO DOS JUÍZES
Não há um órgão específico para supervisionar os juízes. Mas
entidades como o Ombudsman do Parlamento e o Provedor de Justiça têm poderes
para fiscalizar de que maneira os tribunais lidam com diferentes casos, quanto
dinheiro eles gastam e se atuam de forma eficiente.
Não há foro privilegiado para juízes e desembargadores.
Também não há registro de casos de magistrados suecos envolvidos em corrupção.
PRESENTES A JUÍZES, SEGUNDO LAMBERTZ, TAMBÉM SÃO
INACEITÁVEIS.
"Ninguém ofereceria a um juiz coisas como dinheiro,
viagens de cruzeiro ou mesmo garrafas de bebida. Isso simplesmente não
acontece. Na época do Natal, um banco, por exemplo, pode querer oferecer um
presente a autoridades e órgãos públicos. Mas isso nunca acontece nos
tribunais."
"Quando o sistema de justiça de um país não é capaz de
obter o respeito dos cidadãos, toda a sociedade é rompida pela desordem. Haverá
mais crimes, haverá cada vez maior ganância na sociedade, e cada vez menos
confiança nas instituições do país. Juízes têm o dever, portanto, de preservar
um alto padrão moral e agir como bons exemplos para a sociedade, e não agir em
nome de seus próprios interesses", diz Göran Lambertz. Fonte: BBC News
Brasil-2 dezembro 2018
Nenhum comentário:
Postar um comentário