sábado, 12 de janeiro de 2019

A modesta vida dos juízes do Supremo da Suécia

A pergunta que inflamou a reação do magistrado era se, assim como ocorre no Brasil, os juízes da instância máxima do Poder Judiciário sueco têm direito a carro oficial com motorista e benefícios extra-salariais como auxílio-saúde, auxílio-moradia, gratificação natalina, verbas de representação, auxílio-funeral, auxílio pré-escolar para cada filho, abonos de permanência e auxílio-alimentação. "Não consigo entender por que um ser humano gostaria de ter tais privilégios. Só vivemos uma vez e, portanto, penso que a vida deve ser vivida com bons padrões éticos. Não posso compreender um ser humano que tenta obter privilégios com o dinheiro público", acrescentou Lambertz. "Luxo pago com o dinheiro do contribuinte é imoral e antiético", completou o juiz sueco.

Na Suécia, o salário dos magistrados da Suprema Corte - que não têm status de ministro - é de 109,5 mil coroas suecas, o que equivale a aproximadamente R$ 46 mil. Uma vez descontados os altos impostos vigentes no país, os vencimentos de cada juiz totalizam um valor líquido de 59 mil coroas suecas, segundo dados do Poder Judiciário sueco - o equivalente a cerca de R$ 25 mil.

"Isso é o que se ganha, e é um bom salário. Pode-se viver bem com vencimentos desse porte, e é suficiente", diz Lambertz. Ex-professor de Direito da Universidade de Uppsala e ex-Provedor de Justiça (Ombudsman) do Governo, Göran Lambertz chefiou ainda uma das divisões do Ministério da Justiça antes de se tornar juiz da Suprema Corte, cargo vitalício que ocupou até recentemente.

Benefícios extra-salariais, oferecidos a juízes de todas as instâncias no Brasil, não existem para juízes suecos de nenhuma instância.
"Privilégios como esses simplesmente não são necessários. E custariam muito caro para os contribuintes", o jurista sueco Hans Corell, ex-Secretário-Geral Adjunto da ONU para Assuntos Jurídicos. "Não quero emitir julgamentos sobre sistemas de outros países, pois eles têm seus próprios motivos e tradições.  Mas não temos esse tipo de tradição na Suécia", observa Corell.

Nas demais instâncias do Judiciário, o salário médio bruto de um juiz na Suécia é de 66 mil coroas suecas, o que equivale a aproximadamente R$ 28 mil. Em valores líquidos, o salário médio dos juízes é de cerca de 41 mil coroas suecas - aproximadamente R$ 17,4 mil. O salário médio no país é de 32,2 mil coroas suecas (cerca de R$ 13 mil), de acordo com as estatísticas da confederação sindical sueca LO (Landsorganisationen).

NEGOCIAÇÕES SINDICAIS NA SUÉCIA
Para reivindicar reajustes salariais, os juízes suecos seguem o mesmo procedimento aplicado aos trabalhadores de qualquer outra categoria: as negociações sindicais.
A negociação dos reajustes salariais da magistratura se dá entre o sindicato dos juízes suecos (Jusek) e o Domstolsverket, a autoridade estatal responsável pela organização e o funcionamento do sistema de justiça.
A negociação depende essencialmente do orçamento do Domstolsverket, que é determinado pelo Ministério das Finanças.
"Os juízes têm influência limitada no processo de negociação salarial", diz Carsten. "As autoridades estatais do Domstolsverket recebem a verba repassada pelo governo, através do recolhimento dos impostos dos contribuintes, e isso representa o orçamento total que o governo quer gastar com as Cortes. A partir desse orçamento, o Domstolsverket se faz a pergunta: quanto podemos gastar com o reajuste salarial dos juízes?", explica.

JUÍZES SEM SECRETÁRIAS NEM CARROS OFICIAIS
Nos pequenos escritórios dos juízes, não há secretária na porta, nem assistentes particulares.
No sistema sueco, os magistrados contam com uma equipe de assistentes que trabalha, em conjunto, para todos os 16 magistrados da corte. São mais de 30 profissionais da área de Direito, que auxiliam os juízes em todos os aspectos de um caso jurídico.
O tribunal conta ainda com uma equipe de cerca de quinze assistentes administrativos, que auxiliam a todos os juízes. Ou seja: nenhum juiz tem secretária ou assistente particular para prestar assistência exclusiva a ele, e sim profissionais que lidam com aspectos específicos dos casos julgados pela corte.
E nenhum juiz - nem mesmo o presidente da Suprema Corte - tem direito a carro oficial com motorista.

FÉRIAS: MÁXIMO DE 35 DIAS
O período máximo de férias a que os juízes suecos têm direito é de 35 dias por ano. A variação depende da idade do magistrado: juízes de até 29 anos têm 28 dias de férias, e a partir de 30 anos de idade o período é de 31 dias anuais. Juízes acima de 40 anos passam a ter direito a 35 dias de férias.
No Brasil, a lei determina que os juízes, diferentemente dos demais trabalhadores, têm 60 dias de férias por ano.
Qualquer cidadão pode checar as contas dos tribunais e os ganhos dos juízes. Autos judiciais e processos em andamento também são abertos ao público.

FISCALIZAÇÃO DOS JUÍZES
Não há um órgão específico para supervisionar os juízes. Mas entidades como o Ombudsman do Parlamento e o Provedor de Justiça têm poderes para fiscalizar de que maneira os tribunais lidam com diferentes casos, quanto dinheiro eles gastam e se atuam de forma eficiente.
Não há foro privilegiado para juízes e desembargadores. Também não há registro de casos de magistrados suecos envolvidos em corrupção.

PRESENTES A JUÍZES, SEGUNDO LAMBERTZ, TAMBÉM SÃO INACEITÁVEIS.
"Ninguém ofereceria a um juiz coisas como dinheiro, viagens de cruzeiro ou mesmo garrafas de bebida. Isso simplesmente não acontece. Na época do Natal, um banco, por exemplo, pode querer oferecer um presente a autoridades e órgãos públicos. Mas isso nunca acontece nos tribunais."
"Quando o sistema de justiça de um país não é capaz de obter o respeito dos cidadãos, toda a sociedade é rompida pela desordem. Haverá mais crimes, haverá cada vez maior ganância na sociedade, e cada vez menos confiança nas instituições do país. Juízes têm o dever, portanto, de preservar um alto padrão moral e agir como bons exemplos para a sociedade, e não agir em nome de seus próprios interesses", diz Göran Lambertz. Fonte: BBC News Brasil-2 dezembro 2018

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