Estudo mostra impacto da pandemia sobre jovens e revela aumento de 37% nas taxas de mortalidade materna no país. Para pesquisadores, demora de ação pública agravou disseminação da doença.
A covid-19 deixou ao menos
40.830 crianças e adolescentes órfãos de mãe no Brasil nos dois primeiros anos
da pandemia, segundo um estudo divulgado nesta segunda-feira (26/12) pela
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), realizado em parceria com pesquisadores da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Publicado no periódico
Archives of Public Health, o estudo revelou ainda que a covid-19 foi
responsável "por um terço de todas as mortes relacionadas a complicações
durante o parto" entre mulheres jovens – o que representa um aumento de
37% nas taxas de mortalidade materna no Brasil em relação a 2019.
"A cada mil bebês
nascidos vivos, uma mãe morreu no Brasil nos dois primeiros anos da
pandemia", destacou o coordenador do Observa Infância, Cristiano
Boccolini, um dos autores da pesquisa.
Para o estudo, os pesquisadores
cruzaram dados das mortes por covid-19 registrados no Sistema de Informações
sobre Mortalidade (SIM) em 2020 e 2021 com os do Sistema de Informações sobre
Nascidos Vivos (Sinasc) entre 2003 e 2020.
"Considerando a crise
sanitária e econômica instalada no país, com a volta da fome, o aumento da
insegurança alimentar,o crescimento do desemprego, a intensificação da
precarização do trabalho e a crescente fila para o ingresso nos programas
sociais, é urgente a mobilização da sociedade para proteção da infância, com
atenção prioritária a este grupo de 40.830 crianças e adolescentes que perderam
suas mães em decorrência da covid-19", avaliou Boccolini.
O pesquisador em Saúde
Pública da Fiocruz ressaltou ainda a urgência de políticas públicas intersetoriais
para proteger esses órfãos da pandemia.
"É certo que a morte de
um dos pais, em particular da mãe, está ligada a desfechos adversos ao longo da
vida e tem graves consequências para o bem-estar da família, afetando
profundamente a estrutura e a dinâmica familiar. As crianças órfãs são mais
vulneráveis a problemas emocionais e comportamentais, o que exige programas de
intervenção para atenuar as consequências psicológicas da orfandade",
acrescentou Celia Landmann Szwarcwald, pesquisadora da Fiocruz.
COVID RESPONSÁVEL POR QUASE
20% DAS MORTES NESTE PERÍODO
O estudo mostrou também que,
em 2020 e 2021, a covid-19 foi responsável por quase um quinto de todas as
mortes registadas no Brasil (19%). O pico da pandemia ocorreu em março de 2021,
com uma média de cerca de 4 mil óbitos diários. Esse número supera a média de
mortes por dia por todas as causas registrada em 2019.
"A faixa etária de 40 a
59 anos foi a que apresentou a maior proporção de vítimas da covid-19, em
comparação com a mortalidade por outras causas. Neste grupo, um a cada quatro
brasileiros que morreram em 2020 e 2021 tiveram o óbito relacionado à
covid", afirmou Boccolini.
O estudo apontou ainda que a
taxa de mortalidade por covid entre homens a partir dos 30 anos foi 31% maior
do que entre mulheres da mesma faixa etária. Os pesquisadores também descobriram
que a mortalidade pela doença foi três vezes mais elevada entre adultos
analfabetos do que entre aqueles que concluíram o ensino superior.
Para Szwarcwald, as
diferenças nas taxas de mortalidade por nível educacional refletem o impacto
desigual da pandemia sobre as famílias brasileiras socialmente desfavorecidas.
DEMORA DE AÇÃO PÚBLICA
AGRAVOU PANDEMIA
Os pesquisadores concluíram
ainda que a demora na adoção das medidas de saúde pública necessárias para o
controle da covid no país agravou a disseminação da doença, resultando em
perdas de vidas humanas que poderiam ter sido evitadas.
Desde o início da pandemia, o
Brasil registrou mais de 36 milhões de casos de covid e mais de 692 mil mortes
ligadas à doença, segundo dados oficiais. O Brasil é o quarto país do mundo em número
de mortes por 100 mil habitantes, ficando atrás apenas da Grécia, Estados
Unidos e Chile.
"Como consequência da
gestão inadequada da pandemia, além de criar uma legião de órfãos, o Brasil
perdeu cerca de 19 anos de vida produtiva devido à morte de adultos jovens por
covid-19", acrescentou Boccolini.
O estudo foi financiado pelo
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela
Fundação Bill e Melinda Gates e pela Fiocruz. Fonte: Deutsche Welle - 27/12/2022
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