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sábado, 5 de agosto de 2017

A evolução do trabalho ao longo da história

Até a Idade Média, o trabalho tinha má reputação. Então Martinho Lutero o pregou como dever divino. Hoje, robôs ameaçam substituir a mão de obra humana, mas esta pode ser uma oportunidade positiva para os humanos.

ÓCIO COMO IDEAL
Entre os pensadores da Grécia Antiga, trabalhar era malvisto. Aristóteles colocava o trabalho em oposição à liberdade ,e Homero via na ociosidade da antiga nobreza grega um objetivo desejável. O trabalho pesado era para mulheres, servos e escravos.

QUEM FAZ FESTA NÃO TRABALHA
Na Idade Média, trabalhar na agricultura era uma tarefa árdua. Quem era obrigado a trabalhos forçados por seus patrões, não tinha escolha. Mas, quem a tinha, preferia fazer festa e não se preocupar com o amanhã. Pensar em algum tipo de lucro era considerado vício. Uma cota de até cem dias livres por ano servia para garantir que o trabalho não ficasse em primeiro plano.

TRABALHO COMO ORDEM DIVINA
No século 16, Martinho Lutero declarou a ociosidade um pecado. O homem nasce para trabalhar, escreveu Lutero. Segundo ele, o trabalho é um "serviço divino" e ao mesmo tempo "vocação". No puritanismo anglo-americano, o trabalho é visto como um sinal de que quem o executa foi escolhido por Deus. Isso acelerou o desenvolvimento do capitalismo.

A SERVIÇO DAS MÁQUINAS
No século 18, começou a industrialização na Europa. Enquanto a população crescia, diminuía o espaço cultivável. As pessoas migraram para as cidades em busca de trabalho em fábricas e fundições. Em 1850, muitos ingleses trabalhavam 14 horas por dia, seis dias por semana. Os salários mal davam para sobreviver. Descobertas como a máquina a vapor e o tear mecânico triplicaram a produção.

OTIMIZAÇÃO DA LINHA DE MONTAGEM
No início do século 20, Henry Ford aperfeiçoou o trabalho na linha de montagem da indústria automobilística, estabelecendo padrões para a indústria em geral. Com isso, a produção do Ford modelo T foi facilitada em oito vezes, o que baixou o preço do veículo e possibilitou salários mais altos aos funcionários.

SURGE UMA NOVA CLASSE
Com as fábricas surge uma nova classe: o proletariado. Para Karl Marx, que cunhou este termo, o trabalho é a essência do homem. O genro de Marx, o socialista Paul Lafargue, constatou em 1880: "Um estranho vício domina a classe trabalhadora em todos os países (...) é o amor ao trabalho, um vício frenético, que leva à exaustão dos indivíduos". O cartaz acima diz: "Proletários do mundo, uni-vos"

PRODUÇÃO BARATEADA
Ao longo do século 20, aumentaram significativamente os custos sociais com os trabalhadores nas nações mais ricas do mundo. Como resultado, as empresas transferiram a produção para onde a mão de obra é mais barata. Em muitos países pobres prevalecem até hoje circunstâncias que lembram o início da industrialização na Europa: trabalho infantil, salários baixos e falta de segurança social.

NOVAS ÁREAS DE TRABALHO
Enquanto isso são criados na Europa mais empregos no setor de prestação de serviços. Cuidadores de idosos são procurados desesperadamente. Novos campos de trabalho estão se abrindo como resultado das transformações sociais e dos avanços tecnológicos. Com o passar do tempo, a jornada de trabalho foi reduzida e o volume de trabalho per capita diminuiu 30% entre 1960 e 2010.

TRABALHAR, NUNCA MAIS?
Eles não fazem greve, não exigem aumento salarial e são extremamente precisos: os robôs industriais estão revolucionando o mundo do trabalho. O economista americano Jeremy Rifkin fala até de uma "terceira revolução industrial" que irá acabar com salário assalariado.

ROBÔS VÃO NOS SUBSTITUIR?
Esta pergunta já é feita há 40 anos, desde que a automação chegou às fábricas, mas agora a situação parece se acirrar. Com o avanço da digitalização, da Internet das Coisas e da Indústria 4.0, muitas ocupações estão se tornando obsoletas – e não só na indústria.

ADMIRÁVEL MUNDO NOVO (DO TRABALHO)
As máquinas fazem o trabalho e as pessoas têm tempo para o essencial, segundo a utopia. A proteção ambiental, o atendimento de idosos e doentes e o apoio aos necessitados são tarefas no momento executadas primordialmente por voluntários. No mercado de trabalho do futuro, a vocação pode voltar a se transformar em carreira. Fonte: Deutsche Welle – agosto de 2017

sábado, 20 de maio de 2017

Hannover evacua 50 mil por bombas da Segunda Guerra

Cerca de 50 mil moradores da cidade alemã de Hannover foram obrigados a deixar suas casas neste domingo (07/05) por segurança para que especialistas desativem ao menos cinco bombas da Segunda Guerra Mundial encontradas durante uma obra.

As autoridades de Hannover pediram a todos os moradores que estivessem prontos para deixar a região delimitada de segurança às 9h (horário local), embora na sexta-feira algumas das pessoas mais velhas e incapacitadas residentes nessa área já tinham começado a sair do local.

Policiais e bombeiros começaram no início da amanhã a retirar os moradores que ainda estavam na região que abrange parte dos bairros de Vahrenwald, List e Nordstadt e a fechar o acesso à área. Diversos trens, com destino à estação central da cidade, estão sendo desviados.

"Esperamos começar a desativação no início da tarde", afirmou um porta-voz dos bombeiros. Depois da evacuação, a polícia sobrevoa área com câmeras de infravermelho para ter certeza que todos os moradores deixaram o local.

A expectativa das autoridades é que a ação termine à noite e, somente, então os moradores poderão voltar para suas casas. Pelos transtornos, a cidade ofereceu aos atingidos, como compensação, entradas para museus e cinema.

Na área de segurança delineada em Hannover pelos especialistas em bombas estão estabelecimentos de todo tipo, desde asilos, centros para pessoas dependentes e uma clínica, até uma fábrica de pneus e uma central da polícia.

Essa é a segunda maior evacuação organizada na Alemanha desde a Segunda Guerra Mundial. Em dezembro do ano passado em Augsburgo, 54 mil pessoas foram desalojadas para desativar uma bomba britânica.

Como muitas outras cidades alemãs, Hannover foi alvo das bombas aliadas durante a Segunda Guerra Mundial e se estima que somente na noite de 9 de outubro de 1943 as forças áreas britânicas tenham lançado 261 mil projéteis sobre a cidade.

Periodicamente, sobretudo em escavações para realizar obras, são detectados projéteis que não chegaram a explodir. Fonte: Deutsche Welle - Data 07.05.2017

Comentário:
Entre 1940 e 1945, as forças aéreas norte-americanas e britânicas lançaram 2,7 milhões de toneladas de bombas na Europa, metade dessa quantidade na Alemanha. No momento em que o governo nazista se rendeu, em maio de 1945, a infra-estrutura industrial do Terceiro Reich - ferrovias, fábricas de armas e refinarias de petróleo – foram destruídas  e dezenas de cidades alemães foram reduzidas a escombros. Fonte: Smithsonian Magazine

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Conhecimento científico na época do descobrimento do Brasil


O escrivão Pero Vaz de Caminha relata que, ao atracar em Santa Cruz, a esquadra de Cabral foi visitada por dois habitantes da terra, mancebos e de bons corpos, que se metiam em almadias, embarcações rústicas feitas de troncos de madeira atados entre si.
A cena é o encontro entre duas civilizações separadas por um enorme abismo de evolução científica e tecnológica. Enquanto as almadias estão entre as mais primitivas formas de navegação usadas pelo ser humano, as naus e as caravelas portuguesas são o que de mais avançado a arte de navegar produziu até hoje. Nossos navios levam a bordo instrumentos, cartas de navegação e conhecimentos desenvolvidos pelos mais importantes sábios da cristandade – matemáticos, astrônomos, cartógrafos, geógrafos, especialistas na construção de navios e uso de artilharia, vindos de diversos países.

Portugal está na liderança dos descobrimentos porque é o primeiro, entre os países contemporâneos, a transformar a pesquisa tecnológica e científica em política de Estado. É uma aventura que começou dois séculos atrás, com as primeiras e tímidas incursões ao mundo desconhecido, e se completou com a política de portas abertas a especialistas espanhóis, catalães, italianos e alemães, com o propósito de avançar os conhecimentos náuticos de nossos oficiais e marujos.

CARAVELAS
As caravelas são um prodígio da nossa tecnologia e a vanguarda das expedições. São navios velozes e relativamente pequenos. Uma típica caravela portuguesa tem de 20 a 30 metros metros de comprimento, de 6 a 8 de largura, 50 toneladas de capacidade e é tripulada por quarenta ou cinqüenta homens. Com vento a favor, chega a percorrer 250 quilômetros por dia. Utiliza as chamadas velas latinas, triangulares, erguidas em dois ou três mastros. Elas permitem mudar de curso rapidamente e, em ziguezague, velejar até mesmo com vento contrário. A grande vantagem das caravelas sobre os pesados navios mercantes utilizados no Mediterrâneo por genoveses e catalães é a versatilidade. Ideais para navegação costeira, podem entrar em rios e estuários, manobrar em águas baixas, contornar arrecifes e bancos de areia. E também zarpar rapidamente, no caso de um ataque imprevisto de nativos hostis.



NAUS
As naus são barcos maiores e mais lentos. A capitânia de Pedro Álvares Cabral é um navio de 250 toneladas e, ao partir, levava 190 homens. Elas são a ferramenta essencial no comércio já estabelecido com a África e no nascente intercâmbio com as Índias. Na longa viagem de ida, transportam produtos para a troca, provisões, guarnições militares, armas e canhões. Na volta, trazem as mercadorias cobiçadas pela Europa. Suas velas redondas são menos versáteis que as das caravelas, mas permitem uma impulsão muito maior com vento favorável. As caravelas, ao contrário das naus, levam pouca carga. Nem é necessário. Nessa época de grandes descobertas, a carga mais preciosa que elas podem transportar é a informação sobre as rotas marítimas e as terras recém-contatadas – um produto que não pesa nada, mas é vital para as conquistas no além-mar.

CONHECIMENTO CIENTÍFICO E TECNOLOGIA
O grande mérito de Portugal não está na descoberta de novidades científicas, mas na assimilação de conhecimentos, recentes ou antigos, e sua aplicação com propósitos bem definidos, que é abrir rotas de comércio e agregar terras produtivas, onde não haja governo cristão, às propriedades da coroa. As técnicas que hoje permitem aos nossos navios cruzar o Mar Oceano, dobrar o Cabo da Boa Esperança e chegar às Índias são herança dos fenícios, dos egípcios, dos gregos e de várias outras civilizações antigas, guardadas e aprimoradas pelos mouros nos últimos séculos.

A vela latina, que equipa nossas caravelas, foi trazida pelos árabes do Oceano Índico, depois de conquistarem o Egito. O uso do compasso para anotar a direção e a trajetória do navio chegou ao Ocidente no começo do século XIII. A confecção de cartas náuticas os italianos também aprenderam dos árabes, um século atrás. O astrolábio, um revolucionário instrumento de localização utilizado pela esquadra de Cabral na Terra de Santa Cruz, existe desde a Antiguidade e foi recuperado pelos astrólogos medievais para observar, em terra, o movimento e a posição dos astros no firmamento. Mesmo a bússola, fundamental nos descobrimentos, já é usada no Mediterrâneo há muito tempo por genoveses, venezianos e catalães.

São muitos os desafios científicos que os descobrimentos impuseram a Portugal. O maior deles, evidentemente, é sair ao mar alto e voltar para casa com segurança. Até pouco tempo atrás, a navegação se restringia aos portos europeus e da área em volta do Mediterrâneo, todos mapeados e bem conhecidos do mundo civilizado desde a época dos romanos. Navegava-se mais por experiência – que em Portugal chamamos de "conhecenças" – do que por instrumentos. O único tipo de carta náutica disponível até anos atrás eram os mapas do Mediterrâneo desenhados pelos italianos no século XII.

Conhecidos como carta-portulano, forneciam direções e distâncias aproximadas entre os principais portos europeus e africanos.
No começo, as navegações portuguesas pelo Mar Oceano foram relativamente simples, apesar do desafio de enfrentar o desconhecido: bastava ir bordejando a costa da África. Navegava-se apenas durante o dia, usando como referência pontos geográficos, como rios, golfos e montanhas. Quando era necessário navegar à noite, a referência era a estrela Polar, entre nós conhecida como Tramontana. Quanto mais alta a estrela estivesse no céu, mais longe da linha do Equador estaria o navio, na direção do Pólo Norte. As medições eram feitas a olho nu.

Depois foram aperfeiçoadas com o uso de um instrumento chamado quadrante. É um arco graduado, de 45 graus – equivalente a um quarto da esfera terrestre –, equipado com uma agulha e uma linha esticada por um peso de chumbo na ponta. Apontado para a Tramontana, o quadrante fornece a latitude exata em que se encontra o navio.

Quando os nossos marinheiros passaram a se aventurar mais longe da costa, tudo ficou mais difícil. Para fugir das calmarias do Mar Oceano, às vezes é preciso passar semanas sem avistar terra ou qualquer outro ponto seguro de referência. Além disso, ao se aproximar da linha do Equador, a Tramontana fica encoberta no horizonte. Sem ela, é impossível calcular a latitude com ajuda do quadrante. Foi para superar esse tipo de obstáculo que os reis portugueses se empenharam em buscar sábios em outros países.

Os sábios estrangeiros têm vindo a Portugal por duas razões. A primeira é a disposição da corte de oferecer-lhes postos de trabalho e status social que eles não tinham em outros reinos. De cientista em seu país de origem, esses astrônomos, matemáticos e cartógrafos passaram a trabalhar diretamente como conselheiros dos monarcas portugueses e com eles compartilhar a vida na corte. O segundo motivo é a comparativa tolerância religiosa dos portugueses. Mais inflexíveis, os monarcas espanhóis, precursores da idéia de expulsar judeus e mouros que não aceitassem abraçar o cristianismo, beneficiaram Portugal indiretamente. Os conselheiros que dom João II reuniu para desenvolver os conhecimentos náuticos são, em sua maioria, sábios judeus expulsos da Espanha em 1492.

BÚSSOLA E QUADRANTE

                     Quadrante
Um dos primeiros a trabalhar em Portugal foi um judeu convertido ao cristianismo trazido da Ilha de Maiorca para Sagres, em 1420, pelo infante dom Henrique, o Navegador. Mestre Jaime, cujo nome de nascimento era Jafuda Cresques, ficou conhecido como "o Judeu da Bússola". Cartógrafo e fabricante de instrumentos náuticos, acredita-se que tenha sido o primeiro a ensinar aos portugueses o uso da bússola, a agulha magnética que, protegida por uma cúpula de vidro e disposta sobre a rosa-dos-ventos, indica a direção do Pólo Norte e ajuda a identificar a posição percorrida pelo navio.





A bússola e o quadrante são muito úteis às navegações, mas a grande novidade a bordo dos nossos navios neste começo de século é o astrolábio. É um disco, metálico ou de madeira, de 360 graus no qual estão representados todos os astros do zodíaco. Desde a Antiguidade era usado em terra firme, para calcular a posição e o movimento dos astros no céu. O que os portugueses fizeram com a ajuda dos sábios estrangeiros foi simplificá-lo e adaptá-lo para uso em alto-mar. O astrolábio permite calcular a latitude pela passagem meridiana do Sol, ou seja, ao meio-dia, quando o astro se encontra no seu ponto mais elevado no céu. Para isso, é necessário enquadrar o raio solar em dois orifícios existentes no aparelho e, em seguida, fazer alguns cálculos matemáticos.

VANTAGEM TECNOLÓGICA

                Astrolábio
A vantagem tecnológica alcançada pelos portugueses nasceu não propriamente do uso do astrolábio, mas da simplificação desses cálculos. Até pouco tempo atrás, exigia-se para isso certo conhecimento de matemática e astronomia, um grande obstáculo para nossos marujos, dos quais a maioria é rude e iletrada. Outro problema é que os manuais de astronomia e navegação estavam escritos em hebraico, árabe ou latim. A principal tarefa dos conselheiros de dom João II foi reunir todo esse conhecimento, adaptá-lo para a navegação e traduzi-lo para o português, em linguagem acessível aos marujos. O resultado é um manual chamado "Regulamento do astrolábio e do quadrante para determinar cada dia a declinação, o deslocamento do Sol e a posição da estrela Polar". Dividido em cinco partes, ele contém instruções minuciosas sobre como determinar a latitude, com dezessete exemplos práticos em diferentes posições da esfera terrestre. Também ensina a registrar na carta náutica o caminho percorrido pelo navio. A última parte é um calendário de doze meses, sem indicação do ano. Esse calendário informa, para cada dia do ano, a posição do Sol na abóbada celeste.

A viagem de Cabral, pelo que se tem notícia, foi a primeira a fazer uso sistemático do astrolábio como instrumento de navegação – embora Vasco da Gama já tivesse testado o aparelho na precursora missão em que descobriu o caminho das Índias, há três anos. Uma prova da utilidade do astrolábio está na carta que Mestre João, o médico do rei e especialista em navegação embarcado na frota de Cabral, escreveu a dom Manuel. Ele conta que, no dia 27 de abril de 1500, segunda-feira, tomou a passagem meridiana do Sol na Terra de Santa Cruz e calculou a latitude local em 17 graus. Diz ter chegado a essa conclusão baseando-se nas "regras do astrolábio", referência ao manual de instruções. Na carta, Mestre João reclama da dificuldade de usar o instrumento em alto-mar, devido ao balanço do navio, mas encerra com um conselho: "Para o mar, melhor é dirigir-se pela altura do Sol, que não por nenhuma estrela; e melhor com o astrolábio, que não com quadrante nem outro nenhum instrumento". É assim que, na prática, vão se somando os conhecimentos tecnológicos que guiam a aventura dos descobrimentos.

INDÚSTRIA NAVAL
O crescimento da indústria naval transformou a paisagem do litoral português. Os dois maiores estaleiros funcionam em Lisboa e na cidade de Lagos, no Algarve, perto de Sagres. São formigueiros humanos, repletos de esqueletos de caravelas e naus em construção, que atraem gente de toda a Europa. O trabalho é dirigido pelos mestres carpinteiros, artesãos altamente especializados, cujo ofício é passado de pai para filho. São eles os encarregados de selecionar a madeira adequada para cada seção do navio. O carvalho para a quilha – a espinha dorsal dos barcos – é trazido do Alentejo, na fronteira com a Espanha. O pinheiro para o casco vem da costa do Atlântico, cujas florestas são reservas protegidas por lei. O lastro – peso necessário para manter o navio estável abaixo da linha-d'água – é feito de rochas. Nas expedições à África e, a partir de agora, também às Índias, as rochas são lançadas ao mar no porto de destino e substituídas pela carga de especiarias, que fazem o papel de lastro na viagem de volta.

OS ESTALEIROS ATRAEM GENTE DE TODA A EUROPA E MUDAM A ECONOMIA 
Também vital na construção dos navios é a disponibilidade de ferro e de material de vedação, como breu, estopa, alcatrão e cânhamo. A escassez desse tipo de suprimento obriga Portugal a gastar muito dinheiro com importação em outros países. O ferro de melhor qualidade vem das minas bascas, enquanto o cânhamo é produzido nas regiões de Bordéus e da Bretanha, na França. Apesar dos avanços nas técnicas de vedação, a inundação dos navios pela água do mar ainda é um grande problema nas viagens de longa distância. Nossos mestres construtores desenvolveram uma bomba de sucção, feita de madeira com anéis de ferro. Acionada manualmente por um marujo, essa bomba funciona dia e noite nas viagens oceânicas. Só assim é possível manter os barcos à tona.

Outra novidade incorporada à construção naval portuguesa recentemente é o seguro das embarcações. Antes de partir, cada navio contribui com 2% do valor de sua carga para o tesouro real. Em troca, viaja protegido contra perdas em guerras, tempestades e outras catástrofes naturais, e também contra taxas inesperadas em portos estrangeiros.

Uma contribuição decisiva para a aventura portuguesa nos mares foi dada, nos últimos anos, por um sábio judeu de origem espanhola. Abraham-ben-Samuel Zacuto, chamado Abraão Zacuto, é o autor de Almanaque Perpétuo, obra de astrologia que, adaptada ao uso náutico, se tornou fundamental nas expedições do descobrimento. Com 316 páginas e 56 tabelas, o almanaque de Zacuto fornece todas as informações necessárias para a determinação da latitude, incluindo as chamadas declinações, que são as diferentes posições do Sol no zodíaco a cada dia do ano. Redigido originalmente em hebraico, o almanaque foi traduzido para o latim por outro estudioso judeu, José Vizinho, médico do rei dom João II. Hoje, é um manual prático de orientação para nossos pilotos.

Natural de Salamanca, a cidade do saber na Espanha, Zacuto teve de partir depois da expulsão dos judeus pelos reis católicos, em 1492. Imediatamente foi convidado a trabalhar em Portugal como conselheiro de dom João II e, depois, de dom Manuel. Deu instruções pessoais a Vasco da Gama antes da partida da expedição que descobriu o caminho das Índias. Zacuto pertence a uma linhagem de astrólogos que costumavam passar dias e noites observando o céu na tentativa de prever, no movimento dos astros, o destino do ser humano. Hoje, com o avanço da pesquisa científica, a astrologia vai sendo relegada ao terreno das superstições, pelo menos entre os ilustrados. Sem ela, no entanto, a humanidade não teria acumulado tantos conhecimentos sobre os astros, de vital importância para as navegações portuguesas.Fonte: Veja - VEJA, 1° de julho- edição 1501

Comentário:
Já naquela época, o saber e o conhecimento científico eram estratégicos e usados como tecnologia em navegação, com finalidade de  abrir rotas de comércio e anexar terras produtivas as propriedades da coroa portuguesa. Hoje na essência continua a mesma coisa, países com domínio da tecnologia e conhecimento científico dominam o comércio exterior. O Brasil ainda não percebeu que a educação é estratégica  para impulsionar o país para as rotas do competitivo comércio exterior.