Nunca tantos brasileiros chegaram às salas de aula das universidades, fizeram pós-graduação ou MBAs. Mas, ao mesmo tempo, não só as empresas reclamam da oferta e qualidade da mão-de-obra no país como os índices de produtividade do trabalhador custam a aumentar.
A decepção do mercado com o que já está sendo chamado de "geração do diploma" é confirmada por especialistas, organizações empresariais e consultores de recursos humanos.
"Os empresários não querem canudo. Querem capacidade de dar respostas e de apreender coisas novas. E quando testam isso nos candidatos, rejeitam a maioria", diz o sociólogo e especialista em relações do trabalho da Faculdade de Economia e Administração da USP, José Pastore.
RECÉM-FORMADOS QUE NÃO SABEM ESCREVER UM RELATÓRIO OU FAZER UM ORÇAMENTO: Entre empresários, já são lugar-comum relatos de administradores recém-formados que não sabem escrever um relatório ou fazer um orçamento, arquitetos que não conseguem resolver equações simples ou estagiários que ignoram as regras básicas da linguagem ou têm dificuldades de se adaptar às regras de ambientes corporativos.
"Cadastramos e avaliamos cerca de 770 mil jovens e ainda assim não conseguimos encontrar candidatos suficientes com perfis adequados para preencher todas as nossas 5 mil vagas", diz Maíra Habimorad, vice-presidente do DMRH, grupo do qual faz parte a Companhia de Talentos, uma empresa de recrutamento. "Surpreendentemente, terminamos com vagas em aberto."
Outro exemplo de descompasso entre as necessidades do mercado e os predicados de quem consegue um diploma no Brasil é um estudo feito pelo grupo de Recursos Humanos Manpower.
De 38 países pesquisados, o Brasil é o segundo mercado em que as empresas têm mais dificuldade para encontrar talentos, atrás apenas do Japão.
É claro que, em parte, isso se deve ao aquecimento do mercado de trabalho brasileiro. Apesar da desaceleração da economia, os níveis de desemprego já caíram para baixo dos 6% e têm quebrado sucessivos recordes de baixa.
BAIXA PRODUTIVIDADE: Produtividade da industria aumentou apenas 1,1% na última década, segundo a CNI
Mas segundo um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) divulgado nesta semana, os brasileiros com mais de 11 anos de estudo formariam 50% desse contingente de desempregados.
"Mesmo com essa expansão do ensino e maior acesso ao curso superior, os trabalhadores brasileiros não estão conseguindo oferecer o conhecimento específico que as boas posições requerem", explica Márcia Almstrom, do grupo Manpower.
Causas
TRÊS CAUSAS PRINCIPAIS PARA A DECEPÇÃO COM A "GERAÇÃO DO DIPLOMA": Especialistas consultados pela BBC Brasil apontam três causas principais para a decepção com a "geração do diploma".
1-A principal delas estaria relacionada a qualidade do ensino e habilidades dos alunos que se formam em algumas faculdades e universidades do país.
"Ocorre que a explosão de escolas superiores não foi acompanhada pela melhoria da qualidade. A grande maioria das novas faculdades é ruim", diz Pastore.
Para se ter a medida do desafio que o Brasil têm pela frente para expandir a qualidade de seu ensino superior, basta lembrar que o índice de analfabetismo funcional entre universitários brasileiros chega a 38%, segundo o Instituto Paulo Montenegro (IPM), vinculado ao Ibope.
Na prática, isso significa que quatro em cada dez universitários no país até sabem ler textos simples, mas são incapazes de interpretar e associar informações. Também não conseguem analisar tabelas, mapas e gráficos ou mesmo fazer contas um pouco mais complexas.
POSTURA E EXPERIÊNCIA: 2-A segunda razão apontada para a decepção com a geração de diplomados estaria ligada a “problemas de postura” e falta de experiência de parte dos profissionais no mercado.
“Muitos jovens têm vivência acadêmica, mas não conseguem se posicionar em uma empresa, respeitar diferenças, lidar com hierarquia ou com uma figura de autoridade”, diz Marcus Soares, professor do Insper especialista em gestão de pessoas.
“Entre os que se formam em universidades mais renomadas também há certa ansiedade para conseguir um posto que faça jus a seu diploma. Às vezes o estagiário entra na empresa já querendo ser diretor.”
'TRADIÇÃO BAICHARELESCA: 3-Por fim, a terceira razão apresentada por especialistas para explicar a decepção com a “geração do diploma” estaria ligada a um desalinhamento entre o foco dos cursos mais procurados e as necessidades do mercado.
De um lado, há quem critique o fato de que a maioria dos estudantes brasileiros tende a seguir carreiras das ciências humanas ou ciências sociais - como administração, direito ou pedagogia - enquanto a proporção dos que estudam ciências exatas é pequena se comparada a países asiáticos ou alguns europeus.
“O Brasil precisa de mais engenheiros, matemáticos, químicos ou especialistas em bioquímica, por exemplo, e os esforços para ampliar o número de especialistas nessas áreas ainda são insuficientes”, diz o diretor-executivo da Câmara Americana de Comércio (Amcham), Gabriel Rico. Do outro lado, também há críticas ao que alguns veem como um excesso de valorização do ensino superior em detrimento das carreiras de nível técnico.Fonte: BBC Brasil- 9 de outubro
Comentário: Quase metade dos estudantes das redes pública e privada termina o Ensino Médio com o mesmo conhecimento de um aluno de oitava série. Foi isso que concluiu uma pesquisa federal que avaliou os estudantes do Ensino Médio no estado de São Paulo. Pela pesquisa, quase metade dos alunos do terceiro ano teve notas inferior ao patamar fixado como mínimo para a oitava série pela Secretaria Estadual de Educação.
Eles estão prestes a entrar na faculdade, mas na prática não entendem muita coisa do que leem e do que escrevem. O Brasil criou o shopping center da educação. Os estudantes passeiam, fingem que estudam e os professores fingem que ensinam. Saem das universidades com diploma de ignorância relativa.