Um trabalhador brasileiro produz, em média, somente um
quarto do que produz um trabalhador americano.
De um ponto de vista meramente contábil, essa diferença de
produtividade pode ser explicada por três fatores:
1) nossos trabalhadores são menos educados e menos
qualificados (isto é, possuem um menor "capital humano");
2) esses trabalhadores têm a seu dispor menos máquinas,
equipamentos, estruturas e infraestrutura (isto é, possuem menos "capital
físico"); e
3) a ineficiência da economia é tal que trabalhadores com
mesmo capital humano e físico que trabalhadores em países avançados produzem
menos que estes últimos (isto é, a eficiência produtiva –a "produtividade
total dos fatores", no jargão dos economistas– é baixa).
DEFICIÊNCIAS DE CAPITAL HUMANO E INEFICIÊNCIA PRODUTIVA
A importância relativa de cada um desses fatores varia de
país para país. No caso brasileiro, deficiências de capital humano e
ineficiência produtiva são dominantes, com peso maior para essa última. Somos
pouco produtivos principalmente porque nossa mão de obra é pouco educada (e a
qualidade da educação é sofrível) e nossa economia sofre de altíssima
ineficiência.
BAIXA EFICIÊNCIA
Baixa eficiência está associada a fatores institucionais e
excesso de distorções, como má regulação e burocracia, barreiras comerciais e à
adoção de tecnologias estrangeiras, estrutura tributária distorciva e
trabalhosa e intervenções discricionárias do governo nos mercados e preços.
Esses fatores, em nosso caso, fazem com que o ambiente de
negócios brasileiro esteja entre os piores do mundo e impedem firmas de adotar
melhores práticas de negócios e melhores tecnologias. Permitem ainda a
sobrevivência de firmas pouco produtivas, como aquelas no mercado informal ou
outras protegidas por barreiras comerciais ou beneficiadas por créditos
subsidiados.
Adicionalmente, esses fatores institucionais e regulatórios
impedem o crescimento de firmas potencialmente eficientes e incentivam a
especialização em setores nos quais somos pouco competitivos ou não temos ainda
know-how adequado.
O resultado final é uma concentração muito grande de
trabalhadores em firmas pouco eficientes e em setores com baixo dinamismo.
BARREIRAS COMERCIAIS.
Tomemos como exemplo o impacto de barreiras comerciais. Seja
porque a indústria pôde comprar melhores insumos e tecnologias, seja porque a
competição em setores praticamente monopolizados aumentou, o fato é que o
período em que a eficiência e a produtividade do trabalho na manufatura
cresceram mais rapidamente em nosso passado recente foi aquele que se seguiu à
liberalização comercial de 1988/90.
Em vários subsetores a produtividade do trabalho mais que
dobrou em dez anos. Entretanto, no lugar de nos livrarmos dos muitos
impedimentos ao comércio exterior que ainda restaram, nos últimos anos
regredimos ao reintroduzir maiores barreiras tarifárias e não tarifárias.
Má regulação e burocracia são também fatores que afetam
negativamente nossa eficiência, basta comparar com o resto do mundo o custo e o
tempo de embarcar um contêiner nos portos brasileiros, pensar nas filas de
caminhões aguardando embarque de soja nesses mesmos portos e no tempo (e
etapas) para obter uma licença ambiental.
Ou considerar ainda o longo tempo necessário para abrir uma
firma, para conseguir uma licença de construção, na demora em resolver qualquer
questão legal ou no número de empregados necessários em uma empresa para lidar
com tributos e regulamentos.
Dessa forma, horas e mais horas de trabalho são utilizadas
em tarefas que pouco adicionam ao produto final, contribuindo para a redução
geral da produtividade da economia brasileira.
BAIXA QUALIFICAÇÃO DA MÃO DE OBRA
Some-se a isso a baixa qualificação de nossa mão de obra,
que faz não só que se produza de forma menos eficiente uma dada tarefa como
impossibilita que muitas tarefas, métodos e mesmo produtos possam ser levados a
cabo devido à escassez de mão de obra especializada.
Em outras palavras, um trabalhador pouco educado ou
especializado produz menos que outro mais qualificado, mas este último pode
trabalhar em setores de ponta que aquele outro, com pouca educação, não
consegue.
Esse último ponto é especialmente importante, porque
economias modernas estão se transformando em economias de serviço, mas sem mão
de obra adequada não poderemos nos especializar nos serviços mais sofisticados
e tecnologicamente avançados.
OCUPAÇÕES POUCO PRODUTIVAS
Ao contrário, continuaremos a ter uma grande concentração em
ocupações pouco produtivas, como empregadas domésticas, camelôs.
Considere, por exemplo, o fato de que, do valor agregado
final de um iPad, menos de 10% vêm da manufatura do produto. Os outros 90% vêm
de serviços como design, softwares, marketing, branding. O Brasil já possui uma
montadora de iPads –uma etapa mecânica que não exige trabalho qualificado–, mas
os serviços mais elaborados são todos feitos no exterior.
Considere também o fato de que tanto na Coreia do Sul quanto
no Brasil 65% da mão de obra está no setor de serviços, mas a diferença de
produtividade e de subsetores em que se concentra a produção (sofisticados lá,
atrasados aqui) são gritantes e isso se deve em grande medida às diferenças
educacionais.
ENSINO IGNORADO
Durante séculos o Brasil basicamente ignorou educação e a
formação adequada de mão de obra. Embora o quadro hoje seja outro, a média de
escolaridade do brasileiro ainda é baixa, e a qualidade da educação, sofrível.
O ensino médio brasileiro é, na falta de melhor termo, uma
tragédia. É pensado de forma elitista, como uma passagem para o ensino
superior, em um país onde a grande maioria da população não ingressa na
faculdade.
A falta de adequação do ensino médio com a realidade do
jovem faz com que este o abandone antes de terminá-lo e aqueles que terminam
pouco aprendem de útil para sua vida profissional futura.
A expansão do ensino técnico é um alento, mas o ensino médio
na forma atual e a baixa qualidade em geral de nossa educação ainda são
entraves à qualificação adequada do trabalhador brasileiro.
No caso brasileiro, adicione-se ainda uma legislação
trabalhista que estimula a rotatividade e consequentemente não incentiva as
empresas a investir no treinamento de seus trabalhadores.
Assim, com alta ineficiência econômica, baixa qualificação e
educação de má qualidade, não é surpresa que a produtividade do trabalhador
brasileiro seja baixa.
E, se são observados avanços tímidos na educação (expansão
do ensino técnico, por exemplo), nota-se por outro lado um retrocesso na
eficiência econômica, devido à adoção de políticas industriais discricionárias
e de barreiras comerciais, à intervenção desastrada e contínua do governo em
mercados ou ao aumento da complexidade de nosso sistema tributário.
É difícil saber qual será o efeito final, mas dificilmente
veremos no futuro próximo aumentos significativos da produtividade do trabalho
no Brasil, de forma que a distância em relação aos países desenvolvidos
continuará grande. Fonte: Folha de São Paulo - 25/01/2015 -Pedro Cavalcanti Ferreira é professor
da Fundação Getúlio Vargas