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terça-feira, 9 de julho de 2024

Revolução Constitucionalista de 1932 em São Paulo


A Revolução Constitucionalista de 1932 de 1932 completa 92 anos nesta terça-feira (9), data considerada magna no estado de São Paulo por ter marcado o conflito armado entre forças paulistas que tinham por objetivo derrubar o governo de Getúlio Vargas. O militar gaúcho havia assumido a presidência do governo provisório nacional após um golpe de Estado decorrente da Revolução de 1930, contra o presidente eleito Júlio Prestes, representante da política paulista.

O dia tornou-se feriado estadual em 1997, com a aprovação da Lei 9.497 pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) e promulgada pelo ex-governador Mário Covas, que instituiu o 9 de julho como Data Magna de São Paulo.

Outra causa do conflito foi a ruptura da política do ‘café com leite’, a alternância de poder entre as elites de Minas Gerais e São Paulo, que caracterizou a República Velha (1889-1930). Indignados com a situação, setores da sociedade paulista passaram a promover grandes mobilizações populares contra o governo, que se estendiam para outros estados como Minas Gerais, Alagoas e Rio Grande do Sul.

No Rio de Janeiro, em 1931, o Partido Comunista Brasileiro (PCB) organizou uma manifestação contra a carestia, violentamente reprimida. O estopim da fase armada do levante foi uma manifestação no dia 23 de maio de 1932, na Praça da República, onde ficava a sede do governo do interventor nomeado por Vargas.

Foi nessa ocasião em que um conflito após uma invasão a um escritório do Partido Popular Paulista deixou mortos quatro estudantes: Mario Martins de Almeida, Euclydes Bueno Miragaia, Dráusio Marcondes de Souza e Antônio Américo de Camargo Andrade, que passaram a ser mártires do movimento, que adotou a sigla MMDC, com as iniciais dos nomes dos estudantes. Um quinto manifestante morreu dias depois no hospital.

A rebelião armada estourou no dia 9 de julho e voluntários começaram a se apresentar para engrossar o exército a favor da causa paulista. As operações militares começaram no dia 12 de julho com frentes de batalha nas divisas com o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná e no litoral, com pelo menos 50 mil homens. Entretanto, o exército federal era bem maior e melhor equipado, com cerca de 100 mil pessoas, e São Paulo acabou perdendo o apoio dos outros estados, exceto do Mato Grosso.

A batalha durou três meses e acabou com a rendição dos paulistas no dia 2 de outubro. Em maio de 1933, foram realizadas eleições para a Assembleia Constituinte e, em novembro, foi elaborada a Constituição brasileira, promulgada pelo presidente Getúlio Vargas, em 1934.

POLÊMICAS

Segundo o historiador Francisco Quartim de Moraes, as causas para que São Paulo se levantasse em uma guerra civil contra o resto do país são, além de complexas, motivo de polêmica. Moraes explicou que parte da oligarquia paulista, sobretudo aqueles que estavam ligados ao Partido Republicano Paulista, buscavam a retomada do poder, quase hegemônico, que exerceram durante toda a Primeira República.

“Esse poder foi colocado em cheque pela Revolução de 1930. Também lhes motivava o medo de uma Revolução Social mais radical. Outro grupo político, o Partido Democrático, havia apoiado o movimento de 30, mas se sentia alijado dos rumos que o Governo Provisório tomava. Durante a interventoria de João Alberto, nomeado para o cargo por Getúlio Vargas, a crise se agudizou exponencialmente’, disse o historiador.

De acordo com Moraes, o novo interventor, socialista e revolucionário, ex-comandante de um destacamento da Coluna Miguel Costa-Luis Carlos Prestes, tomou uma série de medidas que assustaram o poder político e econômico paulista. Entre elas, houve a promulgação de leis trabalhistas e a tentativa de legalização do Partido Comunista do Brasil no estado de São Paulo.

“Se no início a campanha paulista se centrou no pedido da nomeação de um interventor ‘paulista e civil’ em oposição a João Alberto, que era pernambucano e militar, depois que Vargas nomeou interventores paulistas e civis, como o próprio Pedro de Toledo, que seguiu como governador de São Paulo mesmo durante o movimento armado iniciado em 09 de julho, essa campanha perdeu o seu sentido”, diz o historiador.

Segundo ele, o mesmo ocorreu com a campanha que dá nome oficial ao movimento, quando paulistas (e também outras figuras de todo o país) clamavam pela reconstitucionalização do país. Se em um primeiro momento essa campanha teve força e encontrou eco no pensamento de muitos brasileiros, depois que Vargas promulgou o Código Eleitoral em 24 de fevereiro de 1932, com medidas como o voto feminino, a justiça eleitoral e o voto secreto, e depois marcou oficialmente, em 14 de maio de 1932, a data para que ocorresse a constituinte de 1933-1934, essa argumentação perdeu a maior parte de sua força.

“Ambas as datas são anteriores ao levante de 9 de julho e, portanto, não podem ter sido resultado da guerra civil. São Paulo buscava retornar à federalização garantida pela constituição de 1891. Isso era explícito nos discursos e manifestos do movimento paulista. Enquanto a Revolução de 30 havia tido um caráter centralizador”, explicou.

Para Moraes, embora muitos autores indiquem que a reconstitucionalização seja um legado do movimento paulista de 1932, isso não condiz com a ordem dos fatos. “A reconstitucionalização do país já estava completamente estruturada, nos moldes em que ocorreu meses antes do início da guerra civil. O legado concreto de 1932 é a criação de um sentimento de identidade no povo paulista, o que hoje podemos chamar de paulistaneidade. Realçada todo 9 de julho e que teve no quarto centenário da cidade, em 1954, um momento chave com a criação do Obelisco do Ibirapuera”, finalizou o historiador. Fonte: Agência Brasil - São Paulo - Publicado em 09/07/2024  


sexta-feira, 1 de março de 2024

Os perigos, vícios e diversões da vida noturna na Roma antiga

 Quando o sol baixava, Roma se tornava algo bem diferente das imagens de filmes e séries

Muitos de nós conseguem imaginar os brilhantes espaços cobertos de mármore da Roma antiga em um dia ensolarado, porque esta é a imagem exibida por filmes e séries, além dos livros de história.

Mas o que acontecia ao anoitecer?

Mais especificamente, o que acontecia com a grande maioria da população da cidade imperial que vivia em casas abarrotadas e não nas amplas mansões dos mais ricos?

Lembre-se de que, no século 1 a.C., na época de Júlio César, a Roma antiga era uma cidade de 1 milhão de habitantes: ricos e pobres, escravos e ex-escravos, nativos e estrangeiros.

Foi a primeira métropole multicultural do mundo, com bairros marginais, residências de múltiplas ocupações e zonas de aterros sanitários - e tendemos a nos esquecer disso tudo quando nos concentramos em suas magníficas colunas e praças.

Então, como era a cidade de Roma, a verdadeira Roma, depois que se apagavam as luzes?

CAMINHAR PELAS RUAS PODIA SER FATAL

O melhor ponto de partida é a sátira do poeta Juvenal, que evocou uma imagem desagradável da vida cotidiana em Roma ao redor de 100 d.C..

O poeta Juvenal escreveu uma sátira sobre as noites da Roma antiga.Juvenal alertou sobre os riscos de caminhar pelas ruas ao anoitecer sob janelas abertas. No melhor dos casos, podiam chover os excrementos armazenados durante o dia. No pior, uma pessoa podia ser acertada na cabeça pelos objetos lançados dos andares superiores.

"Penses nos diferentes e diversos perigos da noite. (...)

Se tu fores a um jantar sem um testamento, merecerás a pena de ser chamado de incauto e indiscreto, porque estarás sujeito a muitos perigos.

Há morte sob cada janela aberta em seu caminho.

Farás bem, portanto, se ao céu pedires que a maior desgraça que tentem te causar, seja que se contentem em banhar-te, jogando sobre ti o vaso pestilento."

Juvenal também fala do risco de topar com pessoas ricas que passeavam com seus mantos escarlates e comitivas de seguidores parasitas e empurravam para o lado quem estivesse em seu caminho.

MAS ESTA VISÃO DO POETA DE ROMA À NOITE É PRECISA?

Foi realmente um lugar onde coisas caíam sobre as cabeças dos transeuntes, onde os ricos e poderosos te derrubavam no chão e passavam por cima e no qual, como Juvenal observa em outras passagens, uma pessoa corria o risco de ser assaltada e roubada por gangues de bandidos? Provavelmente, sim.

NÃO HAVIA FORÇA POLICIAL

Fora do esplêndido centro cívico, Roma era um labirinto de ruelas estreitas e corredores. Não havia iluminação pública, nem locais adequados onde jogar fora excrementos ou, ainda, vigilância de uma força policial. Ao anoitecer, deve ter sido um lugar ameaçador.

A única proteção pública possível de esperar era a força paramilitar dos vigias urbanos. O que exatamente faziam e quão efetivos eram são pontos abertos para debate.

Os vigias deveriam proteger Roma de incêndios, mas, quando a cidade ardeu em 64 d.C., eles aproveitaram para saquer

Estavam divididos em batalhões, e sua principal tarefa era vigiar o surgimento de incêndios, algo frequente nos blocos de casas mal construídas, com braseiros ardendo nos andares de cima.

Mas havia poucas ferramentas para lidar com eles, além de uma pequena quantidade de vinagre, algumas mantas para sufocar as chamas e hastes pesadas para derrubar as construções vizinhas e evitar que o incêndio se propagasse.

Às vezes, eles se tornavam heróis. De fato, há um memorial para um vigia em Ostia, perto de Roma, que tentou resgatar pessoas presas pelo fogo e morreu no processo - seu enterro foi pago pelo poder público.

Mas nem sempre eram tão altruístas. No grande incêndio de Roma do ano 64 d.C., a história conta que os vigias participaram dos saques à cidade e se aproveitaram de seu conhecimento sobre ela para encontrar grandes riquezas.

PROTEÇÃO POR CONTA PRÓPRIA

De qualquer forma, os vigias não eram uma força policial e tinham pouca autoridade quando ocorriam pequenos delitos noturnos.

 OS ROMANOS NÃO TINHAM PROTEÇÃO APÓS A CHEGADA DA NOITE

Quem fosse vítima de um, tinha de se defender sozinho, como mostra um caso particularmente difícil discutido em um antigo manual sobre direito romano.

O caso se refere a um comerciante que mantinha seu negócio aberto à noite e deixou uma luminária no balcão que dava para a rua. Quando o objeto foi roubado, o dono da loja perseguiu o ladrão, e eles começaram a brigar.

O criminoso tinha uma arma - um pedaço de corda com um metal na ponta - e a usou contra o comerciante, que reagiu com um golpe tão forte que arrancou o olho do ladrão.

O dilema dos advogados romanos era se o comerciante era responsável pelo ferimento. Em um debate que ecoa alguns dos nossos próprios dilemas de até onde o dono de um negócio ou imóvel pode ir para se defender de um criminoso, os advogados disseram que o ladrão estava armado e havia dado o primeiro golpe, portanto, devia assumir a responsabilidade de ter pedido um olho.

O incidente é um bom exemplo do que poderia ocorrer nas ruas de Roma depois do anoitecer: pequenas brigas podiam ganhar grandes proporções e uma vasilha jogada de uma janela poderia ser fatal.

BARES E JOGOS DE AZAR

Mas a noite romana não era apenas perigosa: era também divertida. Havia clubes, tabernas e bares abertos até altas horas.

Ainda que uma pessoa compartilhasse uma casa pequena com muita gente, se fosse um homem, poderia escapar do aperto por algumas horas para beber, fazer apostas ou se divertir com as garçonetes.

A elite romana desprezava estes locais. Ainda que o jogo fosse uma das atividades favoritas da sociedade romana - dizia-se que o imperador Claudio havia escrito um manual sobre o tema -, isso não impediam que as classes mais altas denunciassem os maus hábitos dos pobres e seu vício em jogos de azar.

Felizmente, temos algumas imagens da diversão em bares romanos do ponto de vista dos cidadãos comuns e não de seus críticos. Elas não estão em Roma, mas nas paredes dos bares de Pompeia, e mostram cenas típicas: grupos de homens sentados ao redor de mesas, pedindo outra rodada de bebidas, a interação entre clientes e garçonetes e uma grande quantidade de jogos. Há até indícios de violência.

E OS RICOS?

Onde estavam os mais ricos durante essa agitada vida noturna nas ruas? A maioria estava comodamente dormindo em suas camas, em casas luxuosas, com o auxílio de escravos e a proteção de cães de guarda.

Por trás das suas portas, reinava a paz - a menos, é claro, que houvesse um ataque -, e só ouviam os sons da vida dura nas ruas. Mas havia romanos na elite para quem a vida nas ruas era muito mais emocionante, e era ali que eles queriam estar.

O imperador Nero costumava vagar pelas ruas de Roma disfarçado para se divertir e provocar confusão

Nas ruas de Roma, podia-se encontrar o imperador Nero em suas noites livres. Ao anoitecer, segundo conta seu biógrafo Suetônio, ele se disfarçava, visitava os bares da cidade e vagava pelas ruas, provocando confusão com seus companheiros.

Quando cruzava com homens a caminho de casa, os golpeava. Quando tinha vontade, invadia lojas fechadas e vendia no palácio o que roubava. Também se metia em brigas e, aparentemente, corria com frequência o risco de ser ferido ou morto.

E, ainda que muitos dos ricos evitassem sair de casa depois do anoitecer, outros faziam isso acompanhados por escravos que atuavam como seguranças privados ou um grande séquito de ajudantes, em busca de diversão.

Pelos relatos de Suetônio, talvez um dos maiores perigos de se andar à noite em Roma fosse encontrar o imperador. Fonte: BBC History - 26 março 2019


segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Ucrânia : O que foi o Holodomor?

A palavra ucraniana Holodomor significa "morte por inanição" e se refere ao período da grande fome vivenciada entre os anos de 1932 e 1933 na então República Socialista Soviética da Ucrânia.

As causas da tragédia estão na coletivização da agricultura, na introdução de cotas inalcançáveis de entrega da produção ao Estado e na perseguição aos agricultores, sobretudo os antigos culaques, no regime do ditador comunista Josef Stalin, durante os primeiros anos do comunismo, no âmbito do que o próprio Stalin chamaria depois de "revolução a partir de cima".

Um número entre 3,5 milhões e 3,9 milhões de pessoas morreram de fome na Ucrânia, que tinha então uma população em torno de 30 milhões. Em toda a União Soviética, o número de mortos pela fome ficou entre 6 milhões e 8 milhões.

Na Ucrânia, as áreas mais atingidas foram as então regiões de Kiev e Kharkiv, bem como a Moldávia, então uma república autônoma.

COLETIVIZAÇÃO DA AGRICULTURA

As origens do Holodomor estão na violenta transformação da agricultura na União Soviética, que havia começado já em 1929, com a coletivização forçada das propriedades rurais. Surgiram os chamados colcoses (colcoz, no singular), as propriedades rurais coletivas do regime comunista soviético.

Muitos agricultores resistiram à coletivização, que acabou sendo feita à força pelo regime soviético. Entre os que resistiram estavam os culaques, agricultores ricos que os comunistas viam como um bastião do capitalismo. Milhares deles foram detidos e enviados para prisões na Sibéria.

Depois de uma safra boa no ano de 1930, a colheita ruim do ano seguinte logo deixaria claro o que significava, na prática, a coletivização agrícola no comunismo soviético.

O regime em Moscou continuou cobrando dos agricultores uma cota fixa de produção, sem considerar se a colheita era boa ou ruim, apelando até mesmo para o confisco de sementes e de cereais forrageiros.

Essa situação se agravou ainda mais em 1932, com uma nova colheita abaixo da média. Se os agricultores não entregassem a cota de produção para Moscou, comandos armados iam até eles para retirar a produção à força.

Mas, mesmo com toda a rigidez aplicada pelo regime para a cobrança, na ampla maioria dos colcoses a cota de produção não podia ser alcançada. Moscou acusava os agricultores de sabotagem e, a partir de 1932, instituiu o terror entre a população rural, com confisco de alimentos, isolamento de regiões inteiras e impedindo, de forma violenta, que a população faminta deixasse o campo rumo às cidades.

Correspondências entre lideranças comunistas mostram que o regime, ciente das mortes por inanição, não apenas nada fazia para impedi-las como ainda as via como medida disciplinatória necessária para que os agricultores aceitassem o trabalho nas fazendas coletivas, que haviam sido criadas à força.

A propaganda do regime afirmava que os agricultores boicotavam o trabalho nos colcoses, escondiam a produção e a vendiam ilegalmente a preços elevados. Assim justificava-se o envio dos comandos armados para o confisco. Estes levavam todos os produtos alimentícios que encontrassem nos vilarejos.

A polícia secreta GPU chegava de surpresa nos vilarejos e inspecionava os galpões. Se algo fosse encontrado, os acusados eram submetidos a um processo sumário e condenados à cadeia ou até mesmo à morte.

Na verdade, o que eventualmente se encontrava eram alimentos que os agricultores haviam escondido para garantir a própria subsistência. Quando também estes eram confiscados, o que restava era morrer de fome.

EM ESPECIAL, A UCRÂNIA

Não só a Ucrânia foi atingida. Também o Cáucaso Norte, a região do rio Volga e a República Soviética do Cazaquistão sofreram com a fome. Um quarto da população do Cazaquistão, ou em torno de 2 milhões de pessoas, morreu.

Mas o terror stalinista atingiu sobretudo a República Soviética da Ucrânia. Por exemplo por meio do isolamento de vilarejos em meio à fome, o que foi ordenado por Stalin apenas para a Ucrânia e para o Cáucaso Norte.

Stalin temia a resistência dos ucranianos à política de coletivização. Numa carta de agosto de 1932, ele escreveu que o Partido Comunista da Ucrânia era cheio de "elementos podres" que estavam apenas aguardando o momento para atacar Moscou. "Se não colocarmos agora a situação na Ucrânia em ordem, arriscaremos perder a Ucrânia", afirmou.

Ainda em 1932, Stalin ordenou uma "limpeza" no aparato do partido comunista na Ucrânia e a perseguição de supostos nacionalistas. Alguns historiadores falam em "guerra de Stalin contra a Ucrânia". Inúmeros intelectuais, escritores, artistas, professores e cientistas foram vítimas dessa perseguição, cujo apogeu foi em 1933. Todos eram suspeitos de defender uma maior autonomia para a Ucrânia e, talvez, até mesmo querer a separação da Ucrânia da União Soviética.

UM TABU NA UNIÃO SOVIÉTICA

Na União Soviética, o Holodomor se tornou um tabu. Declarações públicas eram proibidas. O tema simplesmente não era abordado. Mesmo na época de Nikita Kruschev, quando alguns crimes stalinistas foram tematizados, o Holodomor continuou sendo um tabu. Somente no fim dos anos 1980, com Mikhail Gorbatchov, essa situação começou a mudar.

Na historiografia da Ucrânia, o Holodomor ocupa uma posição central desde a independência do país, em 1991. Em muitas cidades foram erguidos monumentos às vítimas, incluindo a capital, Kiev.

Em 2006, na presidência de Viktor Yushchenko, o Holodomor foi declarado um genocídio, e negá-lo é crime. Pesquisas mostram que a maioria dos ucranianos concorda que o Holodomor foi um genocídio.

O DEBATE SOBRE GENOCÍDIO

Durante muitos anos se debateu se o Holodomor foi ou não foi um genocídio, e mesmo hoje não há consenso entre especialistas. Consenso existe, porém, de que ele foi causado pelo regime comunista de Stalin.

A Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, das Nações Unidas, define genocídio como "atos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso".

Isso implica, no caso da Ucrânia, que deve ser demonstrável que o terror stalinista se voltava contra a etnia ucraniana e tinha a intenção de exterminá-la, no todo ou ao menos em parte.

Os que argumentam contra o genocídio lembram que entre as vítimas não há apenas ucranianos e que também em outras regiões, além da Ucrânia, ocorreram mortes por inanição naqueles anos.

Além disso, afirmam, não há nenhum documento no qual Stalin ordene o extermínio dos ucranianos.

Os que argumentam a favor lembram que a convenção da ONU não fala no extermínio da totalidade de um grupo nacional ou étnico e que basta, para o crime de genocídio, que apenas uma parte dos ucranianos (no caso, os agricultores) tenha sido propositalmente atingida.

Além disso, o fato de que outros grupos estejam entre as vítimas não enfraquece a tese de genocídio, pois esta não requer exclusividade. Também no Holocausto não foram mortos apenas judeus.

E, sobre a intenção, mesmo reconhecendo não haver qualquer documento de Stalin ordenando um extermínio, os partidários da tese afirmam que medidas adotadas, e documentadas, como o confisco de todos os alimentos ou o isolamento de vilarejos em fome, equivalem a uma ordem para matar.

Em 30 de novembro de 2022, o Bundestag (Parlamento da Alemanha) reconheceu o Holodomor como genocídio. Fonte: Deutsche Welle – 21.12.2022

domingo, 14 de junho de 2020

100 dias que mudaram o mundo

Um milhão e quinhentas mil pessoas infectadas pelo mundo —um terço delas na última semana. Oitenta e sete mil mortos em uma velocidade desconcertante. O fim dos deslocamentos. Milhões de pessoas obrigadas a readequar suas rotinas ao limite de suas casas. Há 100 dias, o mundo parou.
Em 31 de dezembro de 2019 um comunicado do governo chinês alertava a Organização Mundial da Saúde para a ocorrência de casos de uma pneumonia "de origem desconhecida" registrada no sul do país. Ainda sem nome, o novo coronavírus alcançaria 180 países ou territórios. "É incrível refletir sobre quão radicalmente o mundo mudou em tão curto período de tempo", indica o diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus.
Para uma das principais historiadoras do país, no futuro, professores precisarão investir algumas aulas para explicar o que vivemos hoje, e o momento que vivemos pode ser comparado à quebra da Bolsa de Nova York, em 1929. "A quebra da Bolsa também parecia inimaginável", afirma Lilia Schwarcz, professora da Universidade de São Paulo e de Princeton, nos EUA. "A aula vai se chamar: O dia em que a Terra parou."
Lilia sugere ainda que a crise causada pela disseminação da covid-19 marca o fim do século 20, período pautado pela tecnologia. "Nós tivemos um grande desenvolvimento tecnológico, mas agora a pandemia mostra esses limites", diz.
A seguir, trechos da entrevista em que a historiadora compara o coronavírus à gripe espanhola, de 1918, diz que o negacionismo em relação a doenças sempre existiu e afirma que grandes crises sanitárias construíram heróis nacionais, como Oswaldo Cruz e Carlos Chagas, e reforçaram a fé na ciência.

COMPLETAM-SE 100 DIAS DESDE QUE O PRIMEIRO CASO DE CORONAVÍRUS, NA CHINA, FOI NOTIFICADO À ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. PODEMOS CONSIDERAR QUE ESSES 100 DIAS MUDARAM O MUNDO?
É impressionante como um uma coisinha tão pequena, minúscula, invisível, tenha capacidade de paralisar o planeta. É uma experiência impressionante de assistir. Eu estava dando aula em Princeton [universidade nos EUA], e foi muito impressionante ver como as instituições foram fechando. É uma coisa que só se conhecia do passado, ou de distopias, era mais uma fantasia.

Nunca se sai de um estado de anomalia da mesma maneira. Crises desse tipo fecham e abrem portas. Estamos privados da nossa rotina, sem poder ver pessoas que a gente gosta, de quem sentimos imensa falta, não podemos cumprir compromissos que tinha previamente planejado.
Mas também abre portas: estamos refletindo um pouco se essa rotina acelerada é de fato necessária, se todas as viagens de avião são necessárias, se todo mundo precisa sair de casa e voltar no mesmo horário. Se não podemos ser mais flexíveis, menos congestionados, com menos poluição.

Então, talvez abra [a oportunidade] para refletir sobre alguns valores como a solidariedade. Todo mundo que diz que sabe o que vai acontecer está equivocado, a humanidade é muito teimosa. Mas penso que estamos vivendo uma situação muito singular, de outra temporalidade, num tempo diferente. Isso pode romper com algumas barreiras: estamos vivendo num país de muito negacionismo. No Brasil vivemos situação paradoxal, o presidente nega a pandemia.

MAS O MUNDO, NESTE MOMENTO, É OUTRO?
Neste exato momento em que conversamos, o mundo está mudado. Nós que éramos tão certeiros nas nossas agendas, draconianas, de repente me convidam para um evento em setembro, eu digo: "Olha, não sei se vou poder ir, se vai dar para confirmar". Essa humanização das nossas agendas, dos nossos tempos, eu penso que já mudou sim.
Ficar em casa é reinventar sua rotina, se descobrir como uma pessoa estrangeira [à nova rotina]. Eu me conheço como uma pessoa que acorda de manhã, vai correr, vai para o trabalho, vai pro outro, chega em casa exausta. Agora, sou eu tendo que me inventar numa temporalidade diferente, que parece férias mas não é. Estar dentro de casa não é ferias, essa ideia de estar no seu lugar, no seu recinto, você é que tem que cumprir com seu horário, isso significa um movimento interior de redescoberta.
Insisto que nem todos passam por isso. Nem todos estão passando por isso da mesma maneira, depende de raça, classe, há diferenças, varia muito.

E EM RELAÇÃO AOS PAPÉIS SOCIAIS DOS HOMENS E DAS MULHERES?
Nós, mulheres, já temos um conhecimento distinto dos homens na noção do cuidado, na casa, acho que a mudança vai ser maior para os homens, que não estão acostumados com o dia a dia da casa, com fazer comida, arrumar, essa ideia de cuidado foi eminentemente uma função feminina.
E estou muito interessada em ver como os homens vão lidar com essa ideia de ficar em casa e ter que cuidar também, é uma experiência muito única que vivemos. Acho que mulheres vão continuar fazendo isso. Não é da natureza feminina, somos socializadas com essa ideia de cuidados.

HÁ DISCUSSÕES QUE DIZEM QUE O SÉCULO 20 CARECIA DE UM "MARCO" PARA SEU FIM E QUE AS PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉCULO 21 AINDA ESTAVAM LIDANDO COM A HERANÇA DO SÉCULO PASSADO. A SENHORA CONCORDA? ESSA PANDEMIA PODE FUNCIONAR COMO ESSE DIVISOR?
Sim. [O historiador britânico Eric] Hobsbawn disse que o longo século 19 só terminou depois das Primeira Guerra Mundial [1914-1918]. Nós usamos o marcador de tempo: virou o século, tudo mudou.
Mas não funciona assim, a experiência humana é que constrói o tempo. Ele tem razão, o longo século 19 terminou com a Primeira Guerra, com mortes, com a experiência do luto, mas também o que significou sobre a capacidade destrutiva.

Acho que essa nossa pandemia marca o final do século 20, que foi o século da tecnologia. Nós tivemos um grande desenvolvimento tecnológico, mas agora a pandemia mostra esses limites.
Mostra que não dá conta de conter uma pandemia como essa, nem de manter a sua rotina numa situação como essa. A grande palavra do final do século 19 era progresso. Euclides da Cunha dizia: "Estamos condenados ao progresso". Era quase natural, culminava naquela sociedade que gostava de se chamar de civilização.
O que a Primeira Guerra mostrou? Que [o mundo] não era tão civilizado quando se imaginava. Pessoas se guerreavam frente a frente. E isso mostrou naquele momento o limite da noção de civilização e de evolução, que era talvez o grande mito do final do século 19 e começo do 20. E nós estamos movendo limites. Investimos tanto na tecnologia, mas não em sistemas de saúde e de prevenção que pudessem conter esse grande inimigo invisível.
A senhora já assinalou que a gripe espanhola matou muito mais do que as duas Grandes Guerras juntas e que, assim como vivemos hoje no Brasil, houve muito negacionismo e lentidão na tomada de decisões. Não aprendemos essa lição? Por que é difícil não repetir os erros?

A doença, seja ela qual for, produz uma sensação de medo e insegurança. Diante desse tipo de crise, sanitária, a nossa primeira reação é dizer: "Não, aqui não, aqui não vai entrar". Antes de virar pandemia, as mortes são distantes, esse discurso do "aqui não", é muito claro, é natural, com todas as aspas que se pode colocar, porque o estado que queremos é de saúde. Mas nós também somos uma sociedade que esquece o nosso próprio corpo, ele serve para botar uma roupa, pentear o cabelo, é como se ele não existisse.
É demorado assumir, o negacionismo existiu sempre. No começo do século, em 1903, a expectativa de vida era de 33 anos. O Brasil era chamado de grande hospital e tinha todo tipo de doença: lepra, sífilis, tuberculose, peste bubônica, febre amarela. Quando entra [o presidente] Rodrigues Alves e indica um médico sanitarista para combater a febre amarela, a peste bubônica e a varíola, eles começam matando ratos e mosquitos e depois passam a vacinar contra a varíola.
Mas na época a população não entendeu, não foi informada e reagiu. O mesmo presidente que indicou Osvaldo Cruz é o que vai estar no poder no contexto da gripe espanhola. Osvaldo Cruz já tinha morrido, então indica o herdeiro dele, Carlos Chagas. [Com a gripe espanhola]

As autoridades brasileiras já sabiam o que estava acontecendo, mesmo assim não tomaram atitude. A gripe entrou a bordo de navios que atracaram no Brasil e aí explodiu. Mas a atitude sempre foi essa: "Aqui não, é um país de clima quente, não é de pessoas idosas".
Como pode falar em ter menos risco no Brasil porque a população é mais jovem, se é muito mais desigual que países europeus que já estão sofrendo? O negacionismo cria o bode expiatório, é recorrente.

MAS POR QUE NÃO APRENDEMOS COM OS ERROS DO PASSADO?
Porque o negacionismo nega a história também. É dizer: "Em 1918 não tínhamos as condições que temos agora, não tínhamos a tecnologia". Então também se pode usar a história de maneira negacionista, negando o passado e dizendo que isso aconteceu naquela época mas não vai acontecer agora.
Quando se fala em guerra, o que acontece? Por que todos os países têm seu exército e tem reserva? Porque, na hipótese de ter uma guerra, temos que ter um exército, tem toda uma população de reserva na hipótese de ter guerra.
Se o estado brasileiro levasse a sério a metáfora bélica, o que já deveria ter sido feito? Uma estrutura para atender guerras de saúde, e isso não é só no Brasil, mas os estados não fazem, não existe um sistema para prevenir as pandemias.
A doença só existe quando as pessoas concordam que ela existe, é preciso ensinar para população. Se não tem esse comando, as pessoas não constroem a doença e continuam a negá-la
As reações contra a gripe espanhola foram muito semelhantes às de agora: poucas pessoas andavam nas ruas, quem andava estava de máscara, igrejas fechadas, teatros lavados com detergente. A humanidade ainda não inventou outra maneira de lidar com a pandemia a não ser esperar pelo remédio ou pela vacina. Fonte: UOL Noticias- 5.abr.20 

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Estátua em monumento a Marechal Deodoro da Fonseca é furtada no Rio

Uma das estátuas que compõe o monumento em homenagem ao Marechal Deodoro da Fonseca, no Centro do Rio de Janeiro, foi furtada neste fim de semana. A escultura em bronze pesa cerca de 400 quilos, tem em torno de dois metros de altura e representa a mãe do Marechal, dona Rosa Paulina da Fonseca. Deodoro da Fonseca foi o primeiro presidente do Brasil, entre 1889 e 1891.

A Polícia Civil informou que o registro do caso foi feito na 9ª DP (Catete), que abriu inquérito para apurar os fatos. “Foi realizada a perícia no local. Diligências estão sendo feitas para identificar e prender os autores”, diz a nota da polícia.

Segundo a Gerência de Monumentos e Chafarizes, vinculada à Subsecretaria Municipal de Conservação, no caso de vandalismo ou furto de grandes peças, como a da mãe do Marechal, é necessário fazer um levantamento orçamentário, depois uma licitação para que seja confeccionada uma nova escultura e feita a reposição.

O restaurador e fundador do grupo SOS Patrimônio, Marconi Andrade, lamenta que mais um monumento da cidade seja danificado. Segundo ele, o monumento, que data de 1937 e abriga os restos mortais do marechal Deodoro e de sua esposa, é alvo de furtos frequentes de figuras históricas e placas informativas. O objetivo dos criminosos é derreter e vender o bronze das peças. Para Andrade, falta fiscalização constante do patrimônio histórico e cultural.

Com um dos maiores acervos do país, a gerência cuida, atualmente, de 1.371 monumentos (entre bustos, esculturas, estátuas, relógios e chafarizes). O órgão informou manter um contrato de manutenção de cerca de R$ 900 mil. Os monumentos sob a tutela do município são vistoriados e os reparos necessários, como limpeza, conserto hidráulico, elétrico e reposição de pequenas peças são programados para que sejam executados ao longo do ano. Fonte: Agencia Brasil -17/02/2020

Comentário: 
BIBLIOGRAFIA: Rosa da Fonseca 

Desde as origens do Exército Brasileiro, na épica Batalha dos Guararapes, destacaram-se vultos que, mercê de seus atributos de liderança, coragem, desprendimento, abnegação e estoicismo, serviram de exemplo vivo, cujas memórias são perpetuadas pela Força Terrestre ao nomeá-los seus Patriarcas e Patronos.

Em reconhecimento à magnitude de sua personalidade e aos seus exemplos de união familiar, de patriotismo e de devoção ao Brasil e à causa militar, o Exército Brasileiro instituiu dona Rosa da Fonseca como a Patrono da Família Militar.

Rosa Maria Paulina da Fonseca nasceu em 18 de setembro de 1802, na então Cidade de Alagoas, capital da Província de mesmo nome, atual município de Marechal Deodoro.

Em 1824, na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, casa-se com o Major do Exército Imperial Manoel Mendes da Fonseca, valoroso militar e grande monarquista.

Mulher de caráter varonil, sempre o apoiou em suas resoluções e o acompanhou, intimorata, nos transes da vida, até seu falecimento, já reformado no posto de Tenente-Coronel, em 24 de agosto de 1859.

Dessa união nasceram dez filhos, sendo duas mulheres, Emília e Amélia, e oito varões. Todos os homens abraçaram a carreira das Armas, ocupando posições de destaque na vida militar, na Política e na Administração Pública Brasileira.

Quando eclodiu a Guerra da Tríplice Aliança, sete de seus filhos seguiram para os campos de batalha. Permaneceu junto a ela seu filho Pedro Paulino, tenente reformado do Exército, literato e estatístico, futuro governador de Alagoas e senador federal por esse Estado.

Na cruenta Batalha de Curuzu, entre 1º e 3 de setembro de 1866, tomba em combate seu filho mais jovem, Afonso Aurélio, aos 21 anos de idade, Alferes do 34º Batalhão de Voluntários da Pátria, atingido quando galgava as muralhas daquela fortificação.
Poucos dias depois, em 22 de setembro de 1866, durante a sangrenta Batalha de Curupaity, outro de seus filhos, o Capitão de Infantaria Hyppólito, perde a vida heroicamente.

Em 6 de dezembro de 1868, na célebre Batalha de Itororó, as "Termópilas paraguaias", a primeira das batalhas da "Dezembrada", outro de seus filhos sucumbe ante o fogo inimigo, o Major de Infantaria Eduardo Emiliano.

Nessa mesma Batalha, dois outros filhos, Hermes e Deodoro, foram gravemente feridos, sendo que esse último recebera três ferimentos por tiros de fuzil.

Durante as comemorações pela vitória em Itororó, ao ser informada da morte de Eduardo e da situação de Hermes e Deodoro, teria dito: "Sei o que houve. Talvez até Deodoro esteja morto, mas hoje é dia de gala pela vitória; amanhã, chorarei a morte deles".

Conta-se também que, ao receber o Oficial que lhe apresentaria os pêsames em nome do Imperador, respondeu que a vitória que a Pátria alcançava, e que todos tinham ido defender, valia muito mais que a vida de seus filhos.

Rosa Maria Paulina da Fonseca, a "Mãe dos Sete Macabeus", faleceu na cidade do Rio de Janeiro, em 11 de julho de 1873, aos 70 anos de idade. Dentre seus filhos que regressaram vivos da Guerra da Tríplice Aliança, destacou-se, especialmente, o Marechal Manuel Deodoro da Fonseca, Proclamador da República, Chefe do Governo Provisório e Primeiro Presidente Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil.

Destacou-se, também, de forma singular, o eminente médico militar, General de Brigada João Severiano da Fonseca, escolhido, em 1962, para ser o Patrono do Serviço de Saúde do Exército Brasileiro.

Seu neto, o Marechal Hermes Rodrigues da Fonseca, foi o 8º Presidente da República, exercendo seu mandato entre 1910 e 1914.

Ao instituir o dia 18 de setembro, data natalícia de Dona Rosa da Fonseca, a Matriarca Exemplar, como o Dia da Família Militar, o Exército Brasileiro presta a devida homenagem à família, na figura de Rosa da Fonseca, reconhecendo a importância do espírito de sacrifício e de luta, o qual possibilita aos integrantes da Força Terrestre alcançarem o sucesso pessoal e profissional, com o sentimento de dever cumprido, seja qual for a missão. Fonte: Exercito Brasileiro

sábado, 1 de fevereiro de 2020

Auschwitz celebra 75 anos de sua liberação

Autoridades de 50 países participam da solenidade no antigo campo de concentração na Polônia, em meio a temores pelo aumento do antissemitismo. "Precisamos tomar cuidado para que não volte a acontecer", diz sobrevivente.

Mais de 200 sobreviventes do Holocausto e delegações de mais de 50 países se reuniram nesta segunda-feira (27/01) no antigo campo de concentração nazista de Auschwitz-Birkenau, na Polônia, para marcar o 75º aniversário de libertação do local, no fim da Segunda Guerra Mundial. A cerimônia ocorre em meio a temores de vários países em relação ao crescente antissemitismo.

Dezenas de sobreviventes, acompanhados de filhos, netos, bisnetos e outros familiares, atravessaram o portão de ferro com a inscrição Arbeit macht frei ("o trabalho liberta"), pelo qual as vítimas passavam antes de serem assassinadas.
Muitos usavam gorros e lenços listrados de azul e branco, simbolizando os uniformes usados pelos prisioneiros. O presidente polonês, Andrzej Duda, também participou da caminhada e depositou flores perto do "muro da morte".

"Precisamos forjar o futuro do mundo com base em uma compreensão profunda do que aconteceu há mais de 75 anos no coração da Europa e no que as testemunhas oculares continuam nos relatando", escreveu Duda em comunicado divulgado antes do evento.
"A verdade sobre o Holocausto não deve morrer. Não cessaremos nossos esforços para fazer o mundo se lembrar desse crime. Para que nada disso aconteça novamente."
Mais de 1 milhão de pessoas, a maioria judias, foram mortas pelos nazistas em Auschwitz. Cerca de 900 mil foram assassinadas em câmaras de gás logo após a chegada ao campo.

CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DE AUSCHWITZ
Soldados soviéticos entraram no campo de concentração de Auschwitz em 27 de janeiro de 1945. Encontraram ali prisioneiros em condições precárias, sem forças para andar. Além de resgatá-los, os militares levaram também caixas de documentos do campo.

Assim, pastas com fichas de prisioneiros, chamadas de "livros da morte", foram preservadas, mas o conteúdo delas só seria revelado em 1991, após o fim da União Soviética.

A busca por novas informações sobre o Holocausto foi constante ao longo das últimas sete décadas. Nesta segunda (27), celebra-se o aniversário de 75 anos da liberação de Auschwitz, complexo onde mais de 1 milhão de pessoas foram mortas, centenas de milhares foram condenadas a trabalhos forçados e que se tornou símbolo da luta para evitar novos genocídios.

A existência dos campos de concentração para judeus já era citada pela imprensa americana e britânica a partir de 1942, mas, em meio ao noticiário da Segunda Guerra, com suas batalhas diárias em várias frentes, o assunto aparecia de modo lateral.

A partir de 1944, conforme os Aliados avançavam em direção a Berlim, os campos de concentração foram descobertos pelo caminho. Os soldados encontram pilhas de corpos queimados, valas comuns e prisioneiros muito doentes.

No entanto, relatos e imagens feitas pelos correspondentes de guerra sofreram controle por parte dos governos. Na França, por exemplo, autoridades não queriam alarmar as famílias sobre o destino dos parentes enviados a combates.

Essa postura mudaria radicalmente a partir de 12 de abril de 1945. Naquele dia, o general americano Dwight Eisenhower, comandante dos Aliados na Europa, visitou o então recém liberado campo de Ohrdruf, na Alemanha.

Ali, Eisenhower ficou chocado ao ver pilhas de corpos com tiros na cabeça, entre outras cenas fortes, e decide retirar todas as restrições à divulgação dos fatos. Além disso, convida congressistas e jornalistas a visitar os campos.

Houve então uma apuração detalhada, com registros em fotos e filmes, que seria usada nos julgamentos de Nuremberg. Os depoimentos durante as audiências, realizadas a partir do final de 1945, trouxeram novos detalhes sobre as atrocidades. Na época, livros com relatos de prisioneiros começaram a ser lançados.

Depois de Nuremberg, foi criado o conceito de crimes contra a humanidade, como saída para uma questão: muitos oficiais nazistas tentaram se defender dizendo que apenas seguiam ordens. A mudança na lei internacional passou a permitir a responsabilização dos executores de extermínios em massa, sem subterfúgios.

Nos anos 1960, houve um novo julgamento de nazistas, e novos fatos. A partir de 1970, historiadores israelenses buscam mudar a forma como se registra a memória do que ocorreu.

"Passou-se a valorizar mais as histórias individuais, em vez de citar os grandes números. No lugar de mostrar uma pilha de sapatos, conta-se a história de um par e de quem foi seu dono", explica Carlos Reiss, coordenador-geral do Museu do Holocausto de Curitiba.

Nas últimas décadas, conforme o prazo de sigilo de documentos oficiais de vários países expirava, historiadores vão desvendando como várias nações e instituições se comportaram em relação ao Holocausto. Fonte: Folha de São Paulo,  Deutsche Welle-27.01.2020



Imagens muito fortes, Campo de Concentração de Ohrdruf,


domingo, 17 de novembro de 2019

Acompanhe a Proclamação da República, hora a hora

Insatisfeitos com o Império, os militares planejavam para o dia 20 de novembro o golpe que proclamaria a República no Brasil.
Mas, no dia 14, começou a correr pelo Rio de Janeiro o boato de que o marechal Deodoro da Fonseca, um dos líderes do movimento, havia sido preso. Diante disso, os republicanos resolveram agir.

6h
Informados sobre a intensa movimentação que ocorria em todos os batalhões militares do Rio de Janeiro, os ministros do gabinete de governo, liderados pelo primeiro-ministro, o visconde de Ouro Preto, se reúnem para discutir formas de enfrentar os militares.
Enquanto isso, as tropas republicanas começam a mobilizar-se pela cidade. Uma grande parte do efetivo policial, vindo de Niterói, desembarca no Rio para se unir ao marechal Deodoro.
Outra parte da força fica na ponte da Armação, a espera de embarcações. O 7º e o 10º Batalhões, além do Corpo de Bombeiros, amanhecem vazios. Os soldados começam a dirigir-se ao campo de Santana, no centro da então capital federal.

7h
Uma força de fuzileiros navais sobe a rua do Ouvidor e começam a ser ouvidos pela cidade as primeiras palavras de ordem em defesa da República gritadas abertamente. Os soldados estão prontos para o confronto armado. Todos os oficiais que acompanham o grupo levam revólveres nas cinturas.

8h
É quase impossível chegar ao campo de Santana devido ao grande número de soldados que se dirige para o local com o objetivo de unir-se aos líderes republicanos.

Uma força do 10º Batalhão, fiel à Monarquia, ocupa todo o largo da Lapa para impedir a passagem de estudantes da Escola Militar, que apoiaram maciçamente a Proclamação.

8h30
O marechal Deodoro da Fonseca encontra-se com o barão de Ladário, que ocupava o cargo de ministro da Marinha, na entrada do ministério.
O barão, afirmando que tinha a obrigação de defender a Monarquia, saca duas armas com o objetivo de atacar Deodoro. Um praça do Exército que presencia a cena entra em ação e atira contra o nobre, que cai ferido.

9h
Todas as estações de polícia são fechadas na cidade. A movimentação de militares nas ruas é cada vez maior. À porta de uma taverna em uma esquina da rua são Lourenço pode ser visto o barão de Ladário, ferido, à espera de cuidados médicos.

9h30
Militares republicanos tomam a Secretaria do Império e cercam a sala onde ocorre a reunião do gabinete ministerial.
Os revolucionários dão voz de prisão aos ministros e afirmam que todos seriam liberados assim que renunciassem a seus cargos.
A situação torna-se tensa, até que Deodoro declara que nenhum dos monarquistas sofreria qualquer agressão ou retaliação, desde que concordassem em reconhecer o novo governo.

10h
Os integrantes do ministério monarquista, sem enxergar outra saída, rendem-se e concordam em anunciar a renúncia coletiva.
Deodoro encaminha-se para o campo de Santana, onde representantes das Forças Armadas o aguardavam, já festejando o sucesso do golpe e o início da República.

10h30
Deodoro entra no quartel de Santana em triunfo, abraçado, entre aclamações. O Exército dá vivas à República. Alunos da Escola Militar conseguem passar pelo largo da Lapa, pois os soldados monarquistas já não ofereciam resistência.

10h45
O marechal Deodoro é carregado em triunfo. O 2º Batalhão de Artilharia dá uma salva de 21 tiros. Está instalada a República. Fonte: Folha de São Paulo - 15.nov.2019

República extinguiu privilégio só dos Braganças

República extinguiu privilégio só dos Braganças, diz historiador Murilo de Carvalho. Historiador lembra que regime proclamado em 1889 não incluiu o povo, e democracia ficou ausente até os anos 1940
O pecado original da República, na avaliação de José Murilo de Carvalho, foi não ter incluído o povo. "A República extinguiu o privilégio dos Braganças, mas não conseguiu eliminar os privilégios sociais", afirma o historiador sobre a proclamação que completa 130 anos nesta sext a-feira (15).
"Para os propagandistas, República e democracia eram indissociáveis. Mas a democracia, isto é, a participação popular no sistema representativo, ficou ausente até a década de 1940", diz Murilo de Carvalho, 80, que é cientista político e imortal da Academia Brasileira de Letras.
Em entrevista ao jornal, o historiador reflete sobre o caráter autoritário e pouco inclusivo do início do período republicano no Brasil e afirma que, 130 anos depois, nossa república "continua sujeita à interferência 'moderadora' das Forças Armadas".

A AUSÊNCIA DE POVO, EIS O PECADO ORIGINAL DA REPÚBLICA, SEGUNDO O SENHOR. COMO E POR QUE O POVO NÃO FEZ PARTE DELA? A afirmação refere-se à origem de nossa República. Para os propagandistas, República e democracia eram indissociáveis. Mas a democracia, isto é, a participação popular no sistema representativo, ficou ausente até a década de 1940. Até essa data, tínhamos uma participação eleitoral inferior à que existiu até 1881, quando foi introduzido o voto direto. Era uma república patrícia, uma república sem democracia.

QUAL O SIGNIFICADO DE UMA REPÚBLICA SEM POVO? Na Grécia, Roma, Estados Unidos a República convivia com a escravidão e com a exclusão política das mulheres. Mas todo homem livre era cidadão ativo. A partir da Revolução Francesa, no entanto, a democracia passou a ser componente indispensável das repúblicas. No Brasil, a efetiva incorporação de povo, homens e mulheres, no sistema representativo só aconteceu após a queda do Estado Novo. A partir daí houve rápida e massiva inclusão eleitoral de povo. Nossa República não suportou a carga e desmoronou em 1964.

O FATO DE ELA TER VINDO POR UM GOLPE MILITAR E NÃO POR UMA REVOLUÇÃO MUDOU O CURSO DELA? Só Silva Jardim acreditava em revolução do tipo da Francesa e pregava o fuzilamento do conde d’Eu [marido da princesa Isabel, descendente da dinastia Orleans]. Não foi nem avisado do golpe. Ninguém mais, além dele, queria sangue. A busca do apoio dos militares do Exército foi oportunismo dos civis, sobretudo de Quintino Bocaiuva.
O problema dos políticos na primeira década da República foi livrarem-se dos militares. Floriano Peixoto garantiu o novo regime, mas era incômodo por despertar um movimento popular jacobino. A posição dominante entre os republicanos, sobretudo os paulistas, era esperar a morte do imperador e então impedir que Isabel tomasse posse. A transição viria de preferência via Constituinte, solução aceita até mesmo por monarquistas como Saraiva [José Antônio Saraiva, que chegou a ser nomeado pelo imperador para formar um gabinete na madrugada de 16 de novembro mas nunca assumiu].

A PARTIDA DA FAMÍLIA IMPERIAL FOI ANTECIPADA PARA EVITAR CONFLITOS. MAS O BRASIL É UM PAÍS VIOLENTO, SUSTENTOU SÉCULOS DE ESCRAVIDÃO E TEM SEQUELAS. QUAL O PAPEL DA VIOLÊNCIA NA NOSSA QUESTÃO REPUBLICANA? A violência está embutida em nosso DNA, independentemente de regimes políticos. Os dez primeiros anos da República foram violentos: revoltas militares, guerra federalista no Sul, Revolta da Armada e, sobretudo, o terrível massacre de Canudos.

Qual tem sido o papel dos militares na nossa República, visto que vez ou outra eles assumem papel na política? O papel variou ao longo do tempo. Após a consolidação do regime com Campos Sales até 1930, a participação foi em boa parte antioligárquica, liderada por oficiais subalternos do Exército. Depois do Estado Novo, o papel passou a ser de tutela, quando não de intervenção direta, comandada pela cúpula militar.

ANTES DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA, TIVEMOS VÁRIAS REPÚBLICAS QUE NÃO VINGARAM PELO BRASIL. O QUE LHES FALTOU? Eram manifestações locais e provinciais, todas derrotadas pelas armas. A de maior êxito foi a Farroupilha que separou o Rio Grande do Sul por dez anos e terminou por um acordo do Império com os gaúchos. A repressão mais violenta verificou-se em revoltas que envolviam segmentos populares, como a Confederação do Equador, a Cabanagem e, já na República, Canudos e Contestado.

O QUE OS BRASILEIROS DESSE FINAL DO SÉCULO 19 ENTENDIAM ENTÃO POR REPÚBLICA? Os republicanos, sobretudo os paulistas, queriam autogoverno, isto é, eleição dos governantes, e federalismo à moda norte-americana. A monarquia significava privilégio de uma família ou dinastia, marca do antigo regime. A palavra democracia, significando governo pelo povo, fazia parte da retórica, mas em nenhum momento foi ativada.

ESSE CONCEITO MUDOU DE ALGUMA FORMA ATÉ 2019? Hoje é difícil saber o que as pessoas querem dizer quando falam em República, além de um sistema de governo. O conceito confunde-se com o de democracia, como queriam os propagandistas.
Os poucos que ainda o distinguem de democracia corretamente o vinculam a certos valores como a igualdade perante a lei, a ausência de privilégios, o bom governo, o cuidado com o bem público. Nesse sentido, pode-se dizer que há hoje mais democracia do que República e talvez seja este um de nossos principais problemas.

O SENHOR CITA EM SEUS ESCRITOS A EXCLUSÃO PELO VOTO —DE 30,6 MILHÕES DE BRASILEIROS, APENAS 2,4 MILHÕES PODIAM VOTAR NA VIRADA DO SÉCULO 19 PARA 20— E, ALÉM DELE, A QUESTÃO DA ABSTENÇÃO —NAS ELEIÇÕES DE 1910, CHEGOU A 40%. QUAL A IMPORTÂNCIA DO VOTO PARA UMA REPÚBLICA? Segundo a distinção proposta, participação eleitoral tem mais a ver com democracia e menos com República. Hoje, uma não pode existir sem a outra. Democracia sem república, sem bom governo, sem igualdade civil, marcada por clientelismo, patrimonialismo, nepotismo, é frágil. Assim como República sem ampla participação não tem futuro.

DESDE 1930, SÓ CINCO ELEITOS PELO VOTO DIRETO CONSEGUIRAM CONCLUIR SEUS MANDATOS [O ATUAL PRESIDENTE ESTÁ NO PRIMEIRO ANO DE GOVERNO]; QUATRO NÃO COMPLETARAM A GESTÃO E SETE PRESIDENTES NÃO FORAM ELEITOS PELO VOTO. ESSA DEMOCRACIA É FRUTO DE FALHAS DA REPÚBLICA? É em boa parte fruto da entrada tardia e rápida do povo no sistema político, da democratização da República. A República patrícia não suportou o impacto e recorreu aos militares para conter a onda democrática, aproveitando-se do conflito ideológico que dominava o cenário internacional.

A REPÚBLICA ESTÁ EM CRISE? Quase todas as repúblicas estão. A nossa continua sujeita à interferência “moderadora” das Forças Armadas.

COMO O SENHOR ANALISA A QUESTÃO FEDERATIVA? A Federação foi uma das demandas mais fortes dos propagandistas, sobretudo dos paulistas e gaúchos. O federalismo norte-americano era o modelo, embora ele tenha assumido aqui sentido oposto.
Isto é, os federalistas norte-americanos eram os que queriam salvar a união das colônias contra as tendências separatistas afinal adotadas pelos sulistas para garantir a escravidão. O federalismo dos pais fundadores acabou preservando a União e abolindo a escravidão, embora à custa de uma sangrenta guerra civil, ao mesmo tempo em que dava ampla liberdade às unidades federadas.
Entre nós, federalismo e centralização é um debate secular. A enorme desigualdade das unidades da Federação leva a uma grande dependência do governo central que, por sua vez, coíbe iniciativas estaduais.

POR VOLTA DE 1627, FREI VICENTE DO SALVADOR ESCREVE UMA CITAÇÃO QUE VIROU CLÁSSICO SOBRE O BRASIL: “NENHUM HOMEM NESTA TERRA É REPÚBLICO, NEM ZELA OU TRATA DO BEM COMUM, SENÃO CADA UM DO BEM PARTICULAR”. O QUE NOS FEZ ASSIM? Apesar de ser lugar-comum, não é possível deixar de mencionar a gênese de nossa economia e de nossa sociedade. Não é que o passado nos condene. Mas as sociedades têm biografia, têm valores e práticas arraigadas. Se não, como entender que com tanta desigualdade não tenhamos tido qualquer revolução social? Como entender que com uma das maiores franquias eleitorais do mundo não consigamos produzir políticas redistributivas, limitando-nos ao assistencialismo distributivista?

O BRASIL DE HOJE TEM REPÚBLICOS? Nossos repúblicos podem ser contados nos dedos. Olhando pelo ângulo da preocupação com o bem coletivo, só os positivistas ortodoxos do início da República foram republicanos. Até iniciativas republicanas acabam comprometidas. Veja-se a Operação Lava Jato.
Nada mais republicano do que igualdade perante a lei. Rico e poderoso no Brasil nunca ia para a cadeia. A Lava Jato os mandou para lá. Vitória da República. Mas aí vem a denúncia de práticas arbitrárias por parte de promotores e juízes que ameaçam a validade das sentenças. Podemos voltar à estaca zero. Derrota da República.

E NOSSA REPÚBLICA, TEM SALVAÇÃO? Só por milagre de frei Vicente. Temos que avançar aos trancos e barrancos, combatendo sistematicamente as desigualdades na economia e os privilégios na sociedade. A República extinguiu o privilégio dos Braganças, mas não conseguiu eliminar os privilégios sociais.
Temos pela frente o imenso problema de incorporar ao mercado de trabalho os milhões de desempregados, subempregados e não empregáveis. Só uma combinação de República e democracia, de bom governo e inclusão, pode resolver o problema, se ainda tiver solução.

CONHEÇA 9 FIGURAS-CHAVE DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

Marechal Deodoro da Fonseca (1827-1892)
Defensor da monarquia, sempre fez questão de declarar-se amigo e súdito fiel do imperador dom Pedro 2º. Foi apenas dias antes da proclamação que Deodoro passou para o outro lado. Ao receber os republicanos Benjamin Constant e Quintino Bocaiuva em sua casa, foi convencido de que o gabinete comandado pelo visconde de Ouro Preto, ministro de d. Pedro 2º, pretendia reduzir gradativamente o poder do Exército e da Marinha. Contrariado com este fato, o marechal decidiu-se a derrubar a monarquia 

Marechal Floriano Peixoto (1839-1895)
Encarregado da segurança do então primeiro-ministro e aliado de d. Pedro 2º, o Visconde de Ouro Preto, se recusou a atirar nos rebeldes que pediam a República e respondeu ao visconde: "Sim, mas lá [no Paraguai] tínhamos em frente inimigos e aqui somos todos brasileiros!". Escolhido vice de Deodoro, assumiu a Presidência em 1891 com a renúncia do presidente

Ruy Barbosa (1849-1923)
Escalado por Deodoro para ministro da Fazenda, o intelectual tinha a missão de modernizar a economia brasileira. Renunciou ao cargo em 1891, porém, com inflação nas alturas decorrente da bolha especulativa criada com as políticas de Barbosa

Benjamin Constant (1836-1891)
Ex-militar e adepto das ideias do positivismo, foi figura importante no trabalho de aproximação dos republicanos e o marechal Deodoro 

Campos Salles (1841-1913)
Foi um dos três republicanos a conseguir se eleger deputado durante o Império. Com a proclamação, foi nomeado ministro da Justiça por Deodoro. Substituiu o Código Penal do Império pelo da República. Em 1898, é eleito o quarto presidente da República 

Quintino Bocaiuva (1836-1912)
Jornalista e político, fundou em 1870 o Partido Republicano. Ao lado de Benjamin Constant, é um dos responsáveis pela conversão do marechal Deodoro, então monarquista, em defensor da república

D. Pedro 2º (1825-1891)
Segundo e último imperador do Brasil, foi derrubado pelo golpe militar que proclamou a República em 15 de novembro de 1889. Dois dias depois, com o banimento da família real, partiu para o exílio na França, onde morreu, esquecido, aos 66 anos 

Princesa Isabel (1846-1921)
Célebre por ter assinado a Lei Áurea, que um ano e meio antes da proclamação da República aboliu a escravidão, tornou-se herdeira do trono após a morte de seus dois irmãos. Partiu para o exílio com o pai em 17 de novembro de 1889. Na França, posicionou-se contra as tentativas de monarquistas no Brasil de restaurar o regime 

Visconde de Ouro Preto (1836-1912)
Primeiro-ministro do gabinete de d. Pedro 2º, foi também ministro da Marinha e da Fazenda. Nos últimos dias da Monarquia, tomou decisões que enfraqueceriam o Exército, o que desagradou o marechal Deodoro e levou ao decisivo alinhamento com os republicanos. Fonte: Fonte: Folha de São Paulo - 15.nov.2019
 José Murilo de Carvalho, formado em sociologia e política pela UFMG, mestre e doutor ciência política pela Universidade de Stanford (EUA).  

Comentário:
Pelo jeito ainda continua válida esta frase: “Nenhum homem nesta terra é repúblico, nem zela ou trata do bem comum, senão cada um do bem particular”. Frei Vicente do Salvador

domingo, 26 de agosto de 2018

A impressionante rede de estradas do império romano que continua gerando riqueza

Todos os caminhos levam a Roma". O que chegou à atualidade como uma expressão popular tinha, na época do esplendor do Império Romano, um sentido quase literal.
Os historiadores calculam que, no ano 117 de nossa era, quando os romanos chegaram ao ponto máximo de expansão geográfica, a intrincada rede de caminhos por eles construídos percorria 80 mil km. Isso equivale a duas voltas inteiras pela Terra.
Estas estradas serviam para o transporte de tropas e suprimentos, que abasteciam as conquistas deste império. Depois, elas se tornaram rotas de comércio e de trocas de mensagens.

ESTES CAMINHOS CONECTAVAM A EUROPA, O ORIENTE MÉDIO E O NORTE DA ÁFRICA.
Ainda é possível percorrer estas rotas, mas não apenas como uma atração turística.
Um grupo de economistas da Universidade de Copenhague, na Dinamarca, chegou à conclusão que a prosperidade gerada por estas estradas há quase 2 mil anos está relacionada ao desenvolvimento do qual gozam hoje os lugares em seus arredores.

O CAMINHO DO PROGRESSO
Digital Atlas of Roman and Medieval Civilizations
Rede de rotas construídas pelo Império Romano percorria 80 mil km
Para chegar a esta conclusão, os pesquisadores compararam um mapa da antiga rede de estradas romanas com um mapa noturno moderno de 2010 - em que é possível ver áreas mais ou menos iluminadas pela rede elétrica.
Para os economistas, a relação é clara: quanto mais luz, maior o progresso econômico.Para aprimorar a análise, foram coletadas também estatísticas atuais da população, densidade das estradas e produção econômica.
Economistas usam grau de iluminação como indicador de desenvolvimento

                                                        O  resultado foi claro: lugares mais próximos a rotas do Império romano tendem a coincidir com aqueles que hoje têm mais estradas, pessoas e desenvolvimento econômico.
Assim, os pesquisadores concluíram que o desenvolvimento de diversas cidades europeias "se deve à persistência de uma notável infraestrutura durante um período de 2 mil anos", aponta o estudo.


A IMPORTÂNCIA DA RODA
Mas, no Oriente Médio e no norte da África, os cientistas perceberam que a relação entre quantidade de estradas e desenvolvimento na atualidade não era tão clara. Por que?
Ocorre que, entre os anos 500 e 1000, o transporte mais utilizado nestas regiões eram as caravanas de camelos, em vez de carroças puxadas por bois.
As caravanas eram mais rentáveis, mas elas não exigiam a pavimentação e manutenção.
Assim, se perdeu a oportunidade de manter uma infraestrutura durante vários séculos.
Portanto, demonstra o estudo: o investimento em infraestrutura é um fator chave na conquista de um desenvolvimento durável. Fonte: BBC Brasil – 19 de agosto de 2018 

sábado, 9 de junho de 2018

Serviço secreto soviético considerou “causar guerra civil no Brasil” em 1961

Jânio Quadros ainda não tinha sido eleito presidente do Brasil quando, em visita a Moscou, em 1959, fez uma promessa ao tradutor que o acompanhava na viagem pela União Soviética: "Quando eu chegar ao poder, e chegarei com 100% de certeza, você será o primeiro a receber o visto". O presidente eleito no ano seguinte nunca saberia, mas Alexandr Ivanovich Alexeyev, que atuara como seu tradutor, era um agente da KGB, a agência de inteligência soviética. Parte dessa história, que culminaria na retomada das relações do Brasil com a União Soviética em 1961, é contada no livro 1964 - O elo perdido (Vide Editorial, 2017), publicado no início deste ano. A obra é fruto da primeira investigação brasileira nos arquivos do serviço de inteligência da antiga Tchecoslováquia, o StB (sigla para "Segurança Estatal"), feita pelo paranaense Mauro Kraenski em parceria com o tcheco Vladimír Petrilák. Submetida à KGB, a StB atuou na América Latina durante a Guerra Fria e seus arquivos servem como aperitivo das ações soviéticas no continente, já que os documentos de Moscou seguem restritos.

"Não há praticamente nada de pesquisa sobre a União Soviética nesse período", comenta o professor Carlos Fico, do departamento de história da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele diz que não há muito interesse sobre o assunto, e cogita que seja por conta da pouca interferência soviética no país. Kraenski chegou aos arquivos tchecos por acaso. Trabalhava como guia no Memorial e Museu Auschwitz-Bikernau, o antigo campo de concentração nazista na Polônia, e se interessou pela história do país. Ao topar com a circulação de informações erradas sobre os soviéticos no contexto polonês, decidiu buscar informações em relação ao Brasil. Procurou na Polônia, mas foi encontrar material mesmo na República Tcheca.

Para conseguir adequar o polonês que ele fala ao tcheco dos documentos, o pesquisador se associou ao tradutor Vladimír Petrilák. Os dois montaram um site para divulgar o resultado das pesquisas e receber contribuições, já que não encontraram nenhuma instituição governamental ou acadêmica disposta a patrocinar a investigação. E qual foi a grande descoberta dos arquivos pela perspectiva dos pesquisadores? “Talvez seja o fato de saber pela primeira vez sobre a atuação de espiões de serviços de inteligência do bloco soviético no Brasil. Ou descobrir que houve brasileiros que, segundo os documentos, colaboraram — de forma consciente ou não, depende do caso — com esse serviço de espionagem estrangeiro”, responde Kraenski, que ressalva algumas vezes ao longo do livro: todas as informações dos arquivos secretos devem ser consideradas com cuidado. Muitas delas não têm fontes alternativas para confirmação, mas, mesmo assim, ele argumenta, são fonte relevante sobre o período.

SERVIÇO DE INTELIGÊNCIA
Os autores do livro se concentraram na pesquisa dos documentos do I Departamento da StB, responsável pelo serviço de inteligência no exterior, onde descobriram que uma rede de 30 agentes e cerca de 100 "figurantes" — potenciais agentes que colaboraram com o serviço de inteligência sem saber — atuou no Brasil de 1952 a 1971. “O serviço de inteligência tchecoslovaco determinava objetos ou alvos de interesse, com o objetivo de entrar, infiltrar ou penetrar operacionalmente através de sua rede de agentes para aquisição de informações ou materiais relacionados com determinadas tarefas", diz Kraenski. Entre os principais alvos estavam o Itamaraty, o Governo federal e o parlamento, além de instituições como a Petrobras, o Exército e o BNDES. Os soviéticos buscavam brasileiros de perfil nacionalista e antiamericano, mas que não tivessem laços tão evidentes com o Partido Comunista Brasileiro, e usavam desde o argumento ideológico e o oferecimento de presentes até o pagamento de honorários e estratégias de chantagem baseadas em informações constrangedoras.

Entre as operações mais ousadas do serviço de inteligência tchecoslovaco, os autores incluem a intermediação de armamentos para o Brasil, a falsificação de documentos para implicar os Estados Unidos no golpe de 1964 e o financiamento de ao menos um jornal, como parte de um projeto — maior e não finalizado — que tinha como meta criar uma emissora de tevê e uma rádio de alcance continental. O envio de 20.000 metralhadoras de produção tcheca para o Brasil acabaria acontecendo sem a interferência direta da StB e chegou a virar assunto no parlamento brasileiro à época. Os documentos também expõem como os tchecos, sempre interessados em disputar com os Estados Unidos a influência na região, atuaram no Brasil para melhorar a imagem do regime cubano pós-revolução e até criaram uma operação para reagir, em 1961, a um possível golpe de Estado.

"O camarada ministro confirmou a operação ativa I-V de criptônimo LUTA, cujo objetivo é causar demonstrações e tumultos antiamericanos e — em caso de seus surgimentos — causar uma guerra civil no Brasil. Um dos objetivos desta operação ativa é fazer com que representantes nacionalistas tomem o poder no Brasil", diz documento de 23 de outubro de 1961 exposto no livro. A operação, que envolveu contatos com o então governador do Rio Grande do Sul Leonel Brizola e as Ligas Camponesas lideradas por Francisco Julião, durou apenas seis meses, de novembro de 1961 a abril de 1962, e provavelmente foi encerrada quando os responsáveis perceberam a dificuldade de executá-la.

O GOLPE
A pesquisa de Kraenski e Petrilák mostra ainda que os tchecoslovacos foram surpreendidos quando os militares tomaram o poder na virada de março para abril de 1964. A falha do serviço de inteligência em antecipar a derrubada do presidente João Goulart foi atribuída posteriormente à falta de contatos entre a direita brasileira. Nos relatórios internos, os agentes destacaram a "hesitação típica de Goulart e a sua incapacidade de levar as coisas até o fim" como motivo de uma queda sem reação. "Não se podia sequer falar em derrota, pois a derrota pressupõe uma luta, e no Brasil houve somente uma tomada pacífica de poder pela direita", diz um trecho do mesmo documento, um relato sobre o golpe de Estado destinado apenas à elite do partido comunista tchecoslovaco.

As atividades soviéticas no Brasil sofreram um grande abalo após a tomada de poder pelos militares. Os agentes tchecoslovacos, que contavam entre seus contatos com jornalistas, funcionários públicos e até um deputado federal, tiveram de se retrair. Vários de seus "figurantes" se refugiaram em embaixadas estrangeiras e no exterior ou perderam os cargos que lhes garantiam relevância. O serviço seguiu por pelo menos mais sete anos, contudo, e seus registros ajudam a entender o clima de desconfiança e medo que levou o país a passar 20 anos sob o jugo de um regime militar. E esse é apenas o início da história do lado soviético. Kraenski diz que ainda há material para ser pesquisado no arquivos e, assim como ocorre no Brasil, desconfia-se que os documentos que os tchecoslovacos registram como destruídos possam estar guardados em algum lugar

OS BRASILEIROS "SÃO PESSOAS PREGUIÇOSAS E BEM LEVIANAS"
Os arquivos tchecoslovacos se prestam também à crítica de costumes. Desde a chegada ao Brasil, em 1952, os agentes registraram suas impressões em relatórios que seriam repassados aos colegas que os substituiriam no futuro. Atuar no Brasil não era exatamente uma prioridade, mas era considerado muito mais seguro do que atuar nos Estados Unidos ou no Reino Unido. Em meio a reclamações sobre o calor que fazia no Rio de Janeiro e a falta d'água por uma semana no apartamento de Copacabana onde o primeiro chefe da rezidentura (base do serviço de inteligência) tchecoslovaca no Brasil se instalou, encontram-se análises sociológicas. "Todo o povo é educado em um espírito de desprezo para com o trabalho, o que pode se observar, por exemplo, quando as faxineiras se recusam a limpar janelas e assoalhos, o que obriga a contratação de mais faxineiras especialmente para isso", registra o agente Jirí Kadlec, de codinome Honza.

Segundo o primeiro agente da StB no Brasil, "homens e mulheres têm unhas tratadas, todos querem a qualquer preço causar a impressão de que não precisam trabalhar fisicamente". Em outro trecho, ele relata violência e assassinatos, um deles cometido a 20 passos da embaixada tchecoslovaca: "Em plena luz do dia, um homem cortou a garganta da esposa porque a mesma não queria partir com ele para outra região do país em busca de uma vida melhor". Em outro relatório, registra-se que "os brasileiros reconhecem como cozinha típica somente a cozinha baiana" e que ela "pode levar à enfermidade". A cervejas são boas, independente das marcas, mas os cigarros são ruins.

O trecho mais impiedoso sobre os brasileiros reproduzido pelos pesquisadores no livro 1964 - O elo perdido coube ao agente Václav Bubenícek (codinome Bakalár): "Um brasileiro, ao contatar com um estrangeiro, possui uma tendência em fazer uma grande quantidade de promessas, já supondo que não cumprirá nenhuma delas". Referindo-se à classe média urbana, ele diz que "são pessoas preguiçosas e bem levianas, com as quais não se pode contar". "Os brasileiros de classe média frequentemente surpreendem um europeu com uma longa lista de faculdades e cursos que terminaram; mas, na verdade, o conhecimento adquirido por eles é muito superficial, o que significa que no Brasil, por regra, encontramos pessoas ignorantes, que, mesmo com numerosos títulos científicos, não chegam aos pés da nossa gente com formação primária", finaliza. Fonte: El País - São Paulo 6 JUN 2018