O funcionário celetista
Marcelo Bahia Odebrecht, ex-presidente do grupo fundado por seu avô, foi
demitido nesta sexta-feira por justa causa. Na prática, já havia perdido o cargo
quando foi obrigado a renunciar em dezembro de 2015, após ser preso na Operação
Lava Jato. Agora perde também o salário de 115.000 reais mensais e todos os
benefícios — advogados, motoristas, secretários, assessores, seguranças — que a
empresa garantiu, inclusive, durante os dois anos em que esteve preso, após ser
condenado por corrupção.
O empresário de 51 anos, no
entanto, sai com 310 milhões de reais, dos quais 240 milhões já foram pagos
pela companhia, fruto de um acordo feito com a empresa para que ele aceitasse
assinar a delação premiada com o MPF. Além de uma participação minoritária de
2,79%, que lhe garante alguma presença nos negócios do grupo, via Kieppe,
holding da família controladora.
Em nota, a Odebrecht informa
que o “desligamento do funcionário” atendeu à recomendação feita em outubro
deste ano pelos monitores externos independentes do Ministério Público Federal
(MPF) e do Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ), que atuam na
empresa há dois anos e meio. A “recomendação” tinha até o dia 31 de dezembro deste
ano para ser acatada. Dos herdeiros, apenas Mauricio Odebrecht, o irmão mais
novo de Marcelo, permanece no conselho da companhia.
A recomendação dos monitores
foi de que nenhuma pessoa sem um “programa de ação” definido — basicamente uma
tarefa que justifique sua contratação —, permanecesse no quadro de
funcionários. Este era o caso de Marcelo, que, conforme o acordo de leniência, estava
impedido de ter qualquer atuação na companhia. Apesar disso, quando teve sua
pena progredida para o regime semiaberto, em setembro deste ano, voltou a
frequentar a sede da Odebrecht em São Paulo. Dos 77 delatores da empresa, os
monitores haviam autorizado a permanência de 19 no dia a dia dos negócios. Hoje
apenas nove ainda trabalham na empresa.
Internamente, no entanto, a
presença de Marcelo causava incômodo. O acirramento da crise familiar dos
Odebrecht, que se arrasta desde o começo das investigações da Lava Jato, foi um
fator determinante na decisão. Marcelo nunca concordou com as decisões tomadas
pelo pai, Emílio, para salvaguardar a empresa. Mesmo preso, negava a
possibilidade de fazer delação, uma medida defendida por seu pai, que conseguiu
escapar da prisão.
Marcelo começou a trabalhar
na Odebrecht logo após se formar no curso de engenharia civil, em 1992. Atuou
como engenheiro júnior na construção de prédios em Salvador e depois nas obras
da hidrelétrica do rio Corumbá, em Goiás. Inicialmente, de forma anônima. Em
meio ao exército de engenheiros da empresa, não utilizava o sobrenome famoso
para evitar o assédio aos herderios. Mas já no começo do milênio decidiu lutar
por uma posição de liderança nos negócios, o que não agradou ao pai, que
preferia uma sucessão profissional. Foi seu avó, o fundador Norberto Odebrecht,
então com 82 anos de idade, que alçou Marcelo ao comando da construtora com
apenas 34 anos, enquanto Emílio assumia o conselho de administração.
A Marcelo sempre se atribuiu
o crescimento exponencial da Odebrecht, o que o novo presidente, Ruy Sampaio,
contesta. “Ele recebeu uma empresa com quatro áreas de negócios e, em seu
projeto de poder, aumentou para 17. Ele queria, a qualquer custo, ser o maior
empresário da América do Sul. Este projeto de poder, que usou corrupção, nos
trouxe a isso”, disse em entrevista ao Valor. Sampaio ingressou na companhia em
1985 e passou pelos anos dourados — a partir de 2009, quando Marcelo assume os
negócios —, na diretoria da Kieppe, controladora da empresa, que também se
beneficiou da corrupção. Fonte: El País - São Paulo - 20 DEC 2019