No dia 29 de agosto de 1831, o jovem Charles Robert Darwin,
então com 22 anos, recebeu uma carta que mudaria sua vida. Um de seus
professores na Universidade de Cambridge, o botânico John Stevens Henslow,
indicara seu nome para participar de uma expedição científica ao redor do
mundo.
Prevista para durar pouco mais de três anos, a viagem de
circum-navegação levou quase cinco. Nesse período, a tripulação do Beagle
enfrentou abalo sísmico no Chile, doença misteriosa na Argentina — alguns
especialistas cogitam a hipótese de Doença de Chagas — e tempestade tropical no
Brasil.
Sim, o Brasil estava entre os mais de dez países, como
Austrália, Nova Zelândia e África do Sul, visitados pelo navio de pesquisa da
Marinha Real Britânica — o HMS, a propósito, significa His Majesty's Ship
("Navio de Sua Majestade") —, ao longo de quatro anos e nove meses.
OBSERVAÇÕES SOBRE O BRASIL
■Darwin ficou encantado com a nossa biodiversidade. A Mata
Atlântica foi o bioma mais rico que ele conheceu. Por outro, ficou revoltado
com a escravidão. Sua família lutava contra o comércio de escravos",
afirma o biólogo Nélio Bizzo.
■"Nunca é agradável submeter-se à insolência de homens
de escritório, mas aos brasileiros, que são tão desprezíveis mentalmente quanto
são miseráveis as suas pessoas, é quase intolerável", reclamou, em 6 de
abril de 1832. Darwin levou um dia
inteiro até conseguir autorização para excursionar pelo interior fluminense.
■Darwin reclama muito da burocracia e chega a dizer que é
interminável", diz o biólogo Charbel El-Hani, coordenador do Laboratório
de Ensino, Filosofia e História da Biologia da Universidade Federal da Bahia
(UFBA).
■A cavalo, Darwin e uma comitiva de seis homens empreenderam
uma viagem de 16 dias, entre 8 e 24 de abril, até Conceição de Macabu, a 227 km
da capital. De maneira geral, a impressão deixada pelos donos de pousada não
foi das melhores. Alguns demoravam até duas horas para servir a refeição.
"A comida estará pronta quando estiver", respondiam os mais
atrevidos. Outros, sequer, tinham garfos, facas ou colheres para oferecer.
■Na Fazenda Campos Novos, em Cabo Frio, os viajantes deram
pela falta de uma bolsa com alguns de seus pertences. "Por que não cuidam
do que levam?", retrucou o hospedeiro, mal-humorado. "Talvez tenha
sido comida pelos cachorros".
■No dia 3 de julho, chegou a rotular os brasileiros de
"ignorantes", "covardes" e "indolentes".
"Até onde posso julgar, possuem apenas uma fração
daquelas qualidades que dão dignidade ao homem", queixou-se. "Não
importa o tamanho das acusações que possam existir contra um homem de posses, é
seguro que, em pouco tempo, ele estará livre. Todos aqui podem ser
subornados."
■A primeira parte da passagem de Darwin pelo Brasil chegou
ao fim em 5 de julho de 1832. Daqui, a expedição seguiu para o Uruguai e, de
lá, para a Argentina. Em setembro de 1835, chegou às Ilhas Galápagos, no Oceano
Pacífico, o ponto mais famoso da viagem.
■ Darwin não teria colocado mais os pés no Brasil se, em
agosto de 1836, ventos contrários não tivessem obrigado o capitão FitzRoy a
atracar novamente no país: de 1 a 6 de agosto em Salvador e de 7 a 12 no
Recife. Apesar de agnóstico, Darwin deu "graças a Deus" por estar,
finalmente, deixando as costas do Brasil. "Espero nunca mais visitar um
país de escravos",
■ O diário de bordo e as anotações de viagem de Darwin,
ricos tanto em descrições geográficas quanto em comentários sociológicos, não
se perderam no caminho. Em 1839, viraram livro, Viagem de Um Naturalista ao
Redor do Mundo, e, em 2015, ganharam uma edição brasileira, O Diário do Beagle,
um calhamaço de 528 páginas lançado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Fonte: BBC News Brasil-23 novembro 2019
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